Pink Elephant: Arcade Fire e o eco vazio de um elefante rosa
- Caue Almeida
- há 2 dias
- 3 min de leitura
É difícil acreditar que estamos falando da mesma banda que nos presenteou com Funeral e The Suburbs

O Arcade Fire que, por quase uma década, definiu o som e o espírito do indie rock norte-americano agora lança Pink Elephant, seu sétimo álbum de estúdio, em meio a um mar de incertezas, polêmicas e tentativas frustradas de se reencontrar com sua própria identidade.
Desde o controverso WE (2022) — vendido como um retorno às origens, mas que nunca decolou —, a banda tem enfrentado um período turbulento. A saída de Will Butler, um dos fundadores, já teria sido o suficiente para balançar qualquer estrutura interna. Mas somada às denúncias públicas contra Win Butler, vocalista e líder criativo da banda, a confiança do público foi abalada de forma quase irreversível. Arcade Fire parecia saber disso. Ao invés de entrevistas ou campanhas promocionais, optaram por um lançamento quase secreto, via um aplicativo fechado chamado Circle of Trust. O nome parece sugestivo demais para ser coincidência — mas será que há realmente algo de confiável nesse novo trabalho?
Pink Elephant surge como uma tentativa de reinvenção íntima, espiritual e estética, mas entrega pouco em qualquer uma dessas frentes. Das dez faixas do álbum, três são instrumentais ambientais, longas e arrastadas, que beiram o experimental pelo experimentalismo, mas que soam mais como sobras de trilha sonora para ficção científica de baixo orçamento do que como peças de arte conceitual. As outras sete músicas, apesar de conterem algumas boas ideias iniciais, rapidamente se perdem em estruturas sem foco, letras insossas e uma produção que deixa a desejar em quase todos os aspectos.
A produção, aliás, é um dos pontos mais frágeis do disco. Mesmo com nomes como Daniel Lanois envolvidos — produtor consagrado por trabalhos com U2 e Bob Dylan — o resultado final é surpreendentemente amador. O som é abafado, desbalanceado e estranho, não no sentido vanguardista que a banda talvez tenha imaginado, mas no sentido mais literal de parecer mal gravado. Em alguns momentos, parece que estamos ouvindo um ensaio mal mixado de uma banda local, não o trabalho de um dos grupos mais celebrados do século XXI.
A escolha de deixar os vocais de Win tão secos e sem qualquer tratamento parece um gesto de coragem estética, mas o resultado é desconfortável: ao invés de vulnerável, soa apenas frágil, como se ele estivesse cantando com dificuldade, tentando reviver uma chama que já se apagou.
Liricamente, o disco também tropeça. Muito do que está presente parece girar em torno de um pedido de perdão não dito — ou pior, mal formulado. Win escreve sobre confiança, dor, renascimento e redenção, mas tudo isso parece filtrado por uma camada espessa de autoindulgência. Faixas como “Circle of Trust” e “Stuck in My Head” tentam trazer profundidade emocional, mas acabam soando como tentativas forçadas de dramatização — uma espécie de martírio performativo, como se o frontman estivesse tentando convencer o ouvinte (e talvez a si mesmo) de que ainda merece ser escutado.
É claro que nem tudo é descartável. “Pink Elephant” e “Year of the Snake”, os dois singles, são faixas competentes, que ao menos demonstram algum resquício do Arcade Fire que tantos aprenderam a amar. “Ride or Die”, com sua levada de bedroom pop nostálgico e os backing vocals doces de Régine Chassagne, também merece menção, ainda que esteja longe de ser memorável. Já faixas como “Alien Nation” tentam se aventurar em um território que mistura new rave com indie eletrônico, mas caem no mesmo problema de todo o disco: boas ideias mal executadas.
A tentativa de subversão em algumas faixas, parece querer ser uma antítese dos hinos “Wake Up” ou “Rebellion (Lies)”, revela o quão Arcade Fire parece estar em guerra consigo mesmo. O clímax nunca chega, a repetição se torna cansativa e a sensação final é de frustração — principalmente porque sabemos que a banda já dominou esse tipo de estrutura narrativa com maestria em outros tempos.
Mais do que apenas um disco fraco, Pink Elephant simboliza um momento preocupante para a banda. É uma oportunidade desperdiçada de se reinventar com honestidade, de confrontar erros e transformar dor em arte. Em vez disso, temos um trabalho confuso, inconsistente e, sobretudo, esquecível. Arcade Fire parece preso em um limbo criativo: entre o passado que não consegue reviver e um futuro que não sabe como construir.
Pink Elephant não é o fim da linha, mas é, sem dúvida, mais um furo no pneu de uma longa estrada que antes parecia promissora. Arcade Fire, que já foi a trilha sonora de descobertas emocionais de toda uma geração, agora soa como um eco de si mesmo — um elefante rosa no canto da sala que todos tentam ignorar, inclusive a própria banda.

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