Um especial que explora o Brasil e a música brasileira em 1973.
Entra e sai ano sempre fica a análise de anos anteriores na arte e na cultura para servir de inspiração e até mesmo de nostalgia, seja para quem nasceu naquele período e para quem não nasceu, usa o recurso da pesquisa para conhecer e usufruir coisas marcantes daquele tempo com sentimentos que passam pela curiosidade de conhecer até a satisfação de apreciar algo que considera maravilhoso.
O ano em questão que será analisado neste último texto desse especial será o de 1973, considerado por muitas pessoas, um ano extremamente agitado, fértil, impactante, emocionante e criativo que pode ser analisado em várias camadas culturais e sociais. Porém, o que será analisado será o Brasil e a música brasileira que vivia uma safra já em anos antes como 1972 um período prolifero, eclético e grande com muita qualidade.
O quinto álbum a ser falado nesse especial será o autointitulado ou simplesmente “Álbum branco” de João Gilberto.
A Bossa Nova possui uma importância gigantesca para a música brasileira e também para a música mundial. O gênero/movimento musical surgiu na década de 1950 no Brasil após seus membros misturarem de forma fina o Samba e o Jazz em um som que transmite poesia para a alma, leveza para os ouvidos e aconchego para o coração em músicas, discos e artistas que trazem profundidade, versatilidade e intensidade visando influenciar, impactar e emocionar gerações de pessoas pela sua forte personalidade artística.
Como dito no parágrafo anterior, a Bossa Nova surgiu no Brasil na década de 1950. Um de seus marcos iniciais foi o sensacional disco “Canção do Amor Demais” da inesquecível cantora Elizeth Cardoso, onde teve composições do músico Antônio Carlos Jobim (mais conhecido como Tom Jobim) e do poeta Vinicius de Moraes. Entretanto, nas faixas, se ouvia um som diferente e suingado de violão que revolucionariam o gênero musical e também a música brasileira. Esse violão era tocado por João Gilberto que era considerado por muitos um verdadeiro mestre musical.
Nascido no dia 10 de junho de 1931, o baiano ao ver a repercussão da “Canção do Amor Demais”, resolveu gravar e lançar através da gravadora Odeon, seu primeiro disco que é o magnífico “Chega de Saudade” em 1959, que é influente até os dias de hoje para a música. O jeito suingado de tocar juntamente com uma voz calma e serena juntamente de João Gilberto com as composições e arranjos de Antônio Carlos Jobim proporcionaram ao “Chega de Saudade” um status de magnitude gigantesca a ponto de ele ser um gênero musical internacionalmente amado e reconhecido, principalmente quando João deu mais Jazz para Bossa Nova e consequentemente uma visibilidade mundial e atemporal quando em 1964 ele gravou e lançou “Getz/Gilberto” onde ele fez essa obra-prima musical com Antônio Carlos Jobim, a bela cantora Astrud Gilberto e o renomado saxofonista estadunidense Stan Getz.
Quando chega o ano de 1973, o baiano já estava consolidado na música por lançar, até então, discos ótimos e referenciais a ponto de competir de igual para igual com a beatlemania, onde ambos proporcionaram trabalhos espetaculares. Mas na década de 1970, os Beatles não estavam mais em atividade e artistas de Rock surgiam cada vez mais para ampliar o gênero musical com nomes como The Who, David Bowie, Pink Floyd, Led Zeppelin, The Doors e Jimi Hendrix.
Já o Jazz se misturava ao Rock e gerou a criação de um novo gênero musical, sendo o Jazz Fusion graças a trabalhos fenomenais de artistas como Miles Davis, Herbie Hancock, Chick Corea e Wayne Shorter que deram um som bem elétrico sem perder as influências e a magnitude.
Enquanto isso, a Bossa Nova estava linearmente estagnada sem muitas mudanças. E elas começaram a surgir quando o baiano se encontrou com o grupo Novos Baianos para influenciar o som que eles iriam realizar fabulosamente bem “Acabou Chorare” no ano de 1972 e que acabou também influenciando no seu “João Gilberto” de 1973.
Mais conhecido como “Álbum Branco”, o “João Gilberto” de 1973, apresenta um músico intimista com uso apenas de seu violão e da bateria de Sonny Carr sem nenhuma orquestração ao trazer regravações de outros músicos do seu nicho e de outros sem ser da Bossa Nova ou do Jazz no repertório do disco com um som atmosférico, simples e ótimo.
O trabalho possui 10 excelentes músicas que abre bem com “Águas de Março” uma poética composição de Antônio Carlos Jobim onde vemos um violão tocado de forma elétrica e envolvente que faz você sentir bem o romantismo da letra. Em seguida, temos “Undiú” um instrumental feito e composto por João Gilberto que dá um toque fino ao álbum. “Na Baixa do Sapateiro” um clássico do repertório de Ary Barroso lançado originalmente em 1938, tem aqui uma versão magnífica que apenas de ouvir faz o ouvinte viajar em um tempo passado que a formalização do que viria MPB e Samba estavam se formado como som elegante das batidas das cordas de um violão.
“É Preciso Perdoar” traz uma suavidade, que é sentida na alma ao elencar uma poesia que atravessa sentimentos e pensamentos, que conquista e amolece corações com sua emocionante interpretação ao ver que é preciso nunca deixar de sentir amor e saber perdoar quando for preciso. "Avarandado" e "Eu Vim da Bahia” são respectivamente composições de Caetano Veloso e Gilberto Gil, que demonstram uma influência tropicalista forte nesse trabalho que foi fundamental para a Bossa Nova se reinventar e misturar a outros gêneros.
“Falsa Baiana” um Samba composto pelo sambista Geraldo Pereira, possui um suingue envolvente na sonoridade que faz o ouvinte querer sambar com sua sonoridade. “Eu Quero Um Samba” é outra primorosa regravação de um Samba consagrado, dessa vez composto por Haroldo Barbosa. "Valsa (Como são Lindos os Youguis)" é mais uma composição e interpretação violinista primorosa de João que deu leveza aos ouvidos. “Izaura” música de Herivelto Martins, importante nome da música brasileira nas primeiras décadas do século XX, tem a voz de Miúcha que trouxe emoções fortes que encerrou o trabalho com um som impactante e extraordinário.
O “Álbum Branco”, de João Gilberto, é considerado um dos melhores discos de estúdio, ao lado de “Amoroso” (1977), “Chega de Saudade” (1959) e “Getz/Gilberto” (1964). O seu tom íntimo e eclético o transformou num disco maravilhoso e influente que redefiniu e consagrou ainda mais João Gilberto, fez a Bossa Nova se reinventar com composições de artistas de outros gêneros musicais e um som íntimo, sem grandes orquestrações, trouxe mais elementos ecléticos para a música brasileira e colocou o ano de 1973 como especial e importante para a música com muita criatividade e harmonia bem envolvida em discos e artistas espetaculares.
João Gilberto
João Gilberto
Lançamento: 1973
Gênero: Bossa Nova, MPB, Jazz, Samba.
Ouça: "É Preciso Perdoar", "Na Baixa do Sapateiro", “Undiú”.
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