Terno Rei faz da ausência um abrigo em Nenhuma Estrela, seu disco mais sereno, pop e profundo
- Marcello Almeida
- há 2 dias
- 3 min de leitura
Entre saudade e reinvenção, o Terno Rei encontra luz onde já não havia nenhuma estrela

É meia-noite no meu quarto e ainda não tem estrela no céu.
Mas tem uma banda, tem um disco, tem um respiro.
E às vezes é tudo o que a gente precisa.
Tem discos que chegam como um abraço silencioso, outros como uma despedida que a gente não queria ter dado. Nenhuma Estrela, quinto álbum do Terno Rei, é um pouco dos dois. Um disco que não grita, mas diz tudo. Que não precisa se explicar. Ele apenas acontece — e nos atravessa.
Lançado em 2025 pela Balaclava Records, o trabalho marca mais uma etapa no amadurecimento sonoro e emocional de Ale Sater, Bruno Paschoal, Greg Maya e Luis Cardoso. Uma banda que, diferente da pressa que consome o mundo, decidiu caminhar com calma. Crescer sem alarde. Lapidar sua identidade sem perder o brilho íntimo das primeiras canções. Eles vêm construindo isso desde Vigília, passando por Essa Noite Bateu Com um Sonho, o delicado Violeta e o agridoce Gêmeos. Mas agora, com Nenhuma Estrela, a banda parece ter encontrado um novo fôlego — como quem respira fundo antes de seguir.
Não é um disco que reinventa a roda. Mas também não precisa. O que o Terno Rei faz aqui é afinar ainda mais o que já vinha soando bonito: canções que falam de amor, tempo, solidão, reencontros e a estranha beleza de continuar mesmo quando tudo parece estagnado. É um trabalho sofisticado, sem excessos. Pop, sem perder a melancolia. Simples, mas jamais raso.
“Próxima Parada” abre como quem olha pela janela do metrô num fim de tarde. A guitarra brinca de esconder referências — tem algo de Nirvana ali, distorcido, reinventado — mas o que fica é o refrão, que cola sem pedir licença. Em “Casa Vazia”, o vazio vira melodia. É como se o Skank do Maquinarama cruzasse com o existencialismo doce do dream pop paulista. “32” e “Viver de Amor” seguem esse mesmo caminho: baladas que falam pouco, mas dizem muito. São canções que se instalam no peito e fazem morada.
Mas é em “Nada Igual” e na faixa-título que o disco atinge o ápice da sensibilidade. A primeira parece saída de algum porão dos anos 80, com ecos de The Smiths e lágrimas contidas. Já “Nenhuma Estrela” é uma daquelas faixas que a gente ouve olhando pro teto, repassando tudo o que viveu — ou que deixou de viver. “Eu estava preso em ti / Mas estava correndo de nós / Eu estava esperando a poeira baixar” — versos que não precisam de explicação. Apenas sentem.
E como se não bastasse a solidez interna da banda, Nenhuma Estrela ainda se abre para novas parcerias. Lô Borges empresta a voz em “Relógio”, e Clara Borges (do Paira) aparece em “Tempo”, numa incursão sutil e elegante pela eletrônica. Nada soa forçado. Tudo soa… certo. Natural. Como se essas conexões já estivessem traçadas no caminho da banda há muito tempo.
Há algo nesse disco que nos ensina sobre continuidade. Sobre o valor de persistir. De amadurecer sem endurecer. De falar de sentimentos sem cair no banal. Em tempos em que tudo parece descartável, o Terno Rei nos lembra do poder das coisas construídas com tempo, afeto e verdade. Nenhuma Estrela é um disco que sabe onde pisa, mas ainda olha pro horizonte. E mesmo sem estrelas visíveis no céu, há uma luz que insiste em brilhar por dentro.
Talvez seja isso. Nem sempre a gente precisa de uma estrela no alto. Às vezes basta um disco desses.
E tudo fica mais suportável.

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