Dia de Caça lança muitas ideias para o espectador embora elas não se sintonizem de forma completa
- Eduardo Salvalaio
- há 7 dias
- 2 min de leitura
O problema do filme é trazer elementos essenciais dentro de uma narrativa, mas não conectá-los tão perfeitamente

Dia de Caça (Jour de Chasse, 2024) é o primeiro longa metragem da diretora e roteirista canadense Annick Blanc. Com seus curtas, ela ganhou algumas algumas premiações canadenses que concorreu e passou a ser uma das cineastas mais promissoras dentro do cinema do país.
Dia de Caça é um daqueles filmes que começam sem muitas explicações e que colocam logo seus personagens diante de um evento conturbado. Aqui, neste caso, a intensa Nina (Nahéma Ricci) é uma trabalhadora sexual que é obrigada a aceitar carona de um homem após perder um cliente e não ter como ir embora para casa.
Apresentando o belíssimo e idílico cenário das florestas canadenses, Nina precisa passar um tempo com cinco homens numa cabana até que consiga um jeito de sair dali. É onde o espectador ficará se perguntando qual a verdadeira intenção do filme. Seria mais um filme com o tema do estupro alavancando sua narrativa? Para tanto, precisamos seguir adiante.
Com uma cena que reúne ao mesmo tempo nervosismo e acolhimento, a mulher precisa passar por um ritual de iniciação caso queira seu lugar no grupo. A cena em si é muito bem produzida e deixa no espectador a angústia de Nina em relação ao um ambiente machista que nos indica que a qualquer instante tudo está prestes a explodir.

Entretanto, essa passagem é apenas o começo de uma estadia que não será tão tranquila, sobretudo após a chegada de outro personagem e de um evento que trará abalos emocionais e consequências ao grupo (onde presenciamos até um machismo ser despedaçado em pura fragilidade).
O problema do filme é trazer elementos essenciais dentro de uma narrativa, mas não conectá-los tão perfeitamente. Cenas que misturam o real, o imaginário e o onírico acabam dispersas. Simbolismos, alegorias e até mesmo as críticas sociais que o filme guarda também podem não ser tão compreendidas pelo espectador.
Na soma final, a capacidade que um filme desses deveria ter de nos perturbar e de nos levar a refletir fica incompleta. Assuntos como coletividade, hierarquia social, a natureza do homem perante situações de risco e a masculinidade tóxica podem até estar inseridos aqui, contudo faltou uma estrutura mais adequada ao contexto narrativo.
Mesmo assim, a duração curta do filme (menos de 80 minutos), a atmosfera sombria tonificada por uma densa floresta que parece impossibilitar a saída do lugar, o temperamento de Nina (a melhor personagem), a fotografia do premiado Vincent Gonneville ainda nos conduzem para os créditos finais, mesmo com certo cansaço.
O filme também não explica muito sobre seu final. Um fechamento que não entrega respostas fáceis e deixa espaços para indagações. Mesmo com a efusiva canção ‘Happy Together’ do The Turtles tocando ao fundo, o espectador novamente estará diante de uma cena nervosa e chocante, filmada em câmera lenta para enfatizar a situação.
Pena que o filme foi mais visualmente bonito do que bem amarrado em suas ideias e reflexões. Digamos que Annick precisa adequar melhor essas duas partes em sua próxima produção.

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