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500 Dias com Ela: o amor como espelho, não como conto de fadas

Nem toda história de amor é feita para durar. Mas algumas são feitas para mudar quem a gente é

(500) Dias com Summer
Imagem: Reprodução

Há quem diga que (500) Dias com Ela é uma comédia romântica. Mas o aviso já vem no início do filme: “Esta não é uma história de amor. Esta é uma história sobre o amor.” E isso muda tudo. Porque, ao contrário das narrativas tradicionais, essa história não é sobre dois que se encontram e vivem felizes para sempre. É sobre o que acontece quando um só ama, ou quando ama demais, ou quando ama errado.



Tom é um arquiteto frustrado que escreve cartões de felicitações. Acredita em destino, em almas gêmeas, em amores predestinados. Summer é prática, leve, cética — mas também encantadora, imprevisível, magnética. O que Tom vê nela é mais do que ela realmente é: ele projeta. Ele idealiza. Ele acredita. E a gente vê tudo pelos olhos dele, o que torna essa história menos sobre uma relação e mais sobre a forma como ele construiu, viveu e desmoronou essa paixão.


Durante 500 dias, o filme alterna cenas como quem remexe uma caixa de lembranças: um dia feliz, outro amargo, outro em que nada aconteceu, outro que doeu. É a dor de cotovelo como narrativa. A gente assiste ao amor nascer, tropeçar, se inflar, se perder — e, principalmente, ao esforço desesperado de tentar entender o que aconteceu. E talvez o que mais machuque Tom — e a nós também — seja perceber que o que existia era uma expectativa. Um desejo. Uma fantasia bonita demais para caber na realidade.


Imagem: Reprodução
Imagem: Reprodução

Muita gente saiu do cinema achando que Summer foi fria, distante, talvez até cruel. Mas ela nunca prometeu. Nunca iludiu. Sempre foi honesta sobre seus limites e desejos. Tom é quem construiu um castelo com os tijolos que ela nunca quis empilhar. O amor, nesse filme, não é um contrato. É um espelho — e muitas vezes ele reflete só a gente mesmo, sozinho, esperando reciprocidade onde talvez nunca houve sintonia.


A força do filme está também na sua forma. A narrativa fragmentada, a contagem não linear dos dias, os recursos gráficos, os silêncios, tudo isso constrói a sensação de memória emocional. E a trilha sonora é quase um personagem. The Smiths, Regina Spektor, Doves, Simon & Garfunkel, Carla Bruni, Temper Trap — cada música acompanha o estado de espírito de Tom, como se a vida interior dele tivesse seu próprio disco.



Há uma cena marcante em que ele canta, em um karaokê, “Here Comes Your Man”, dos Pixies — e ali está toda a essência do encantamento juvenil: a crença apaixonada de que finalmente chegou “o cara certo”, como se o mundo todo conspirasse a favor daquele sentimento. É uma cena leve, divertida, mas também carregada de simbolismo: mostra o quanto a paixão pode dar uma coragem quase cega. A música, ali, é mais do que trilha — é sintoma.



O filme não ensina a evitar a dor. Pelo contrário: mostra que ela é necessária. Que sentir muito, errar, insistir, imaginar demais — tudo isso faz parte de amar. E também de crescer. A jornada de Tom é emocionalmente densa, mas profundamente humana. Não há fórmulas, não há vilões nem heróis. Apenas pessoas tentando se entender no meio das incertezas. Summer não é a vilã. Ela é só uma mulher vivendo à sua maneira. Tom não é a vítima. É só um cara tentando se encontrar no próprio sentimento. E (500) Dias com Ela, ao invés de nos oferecer um final feliz, nos oferece algo melhor: lucidez.


Talvez por isso o filme continue atual. Porque fala da dor sem drama, do fim sem derrota, do amor sem enfeite. É o tipo de filme que você assiste uma vez com os olhos de quem ama — e reassiste com os olhos de quem entendeu.

ree

⭐️⭐️⭐️⭐️⭐️

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