Pink Floyd e The Dark Side of the Moon: o lado sombrio que iluminou a música
- Marcello Almeida
- há 24 horas
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Um disco que nunca termina, mesmo quando a agulha já saiu do vinil

Lançado em março de 1973, The Dark Side of the Moon não é apenas um disco, mas uma jornada filosófica sobre a vida, a morte e tudo que existe entre elas. Oitavo álbum de estúdio do Pink Floyd, ele trouxe Roger Waters como principal força criativa, com letras profundas e reflexivas, guiando os colegas David Gilmour (guitarra, voz), Nick Mason (bateria) e Richard Wright (teclados). Meio século depois, a obra continua a provocar debates, interpretações e até polêmicas científicas, reafirmando-se como um dos álbuns mais icônicos da história da música.
A banda e a virada conceitual
Até 1973, o Pink Floyd já havia flertado com ideias conceituais, mas nunca entregou um trabalho totalmente estruturado nesse sentido. The Dark Side of the Moon nasceu com propósito definido: Waters assumiu toda a criação lírica, inaugurando uma era de êxitos e também de tensões internas. Como David Gilmour explicou à Rolling Stone em 2011, “Eu nunca me considerei muito bom no departamento de letras e Roger queria fazer aquilo. Ao mesmo tempo, ele ser o letrista e a força motriz nunca significou que ele teria que estar no controle total da direção no lado musical das coisas. Então sempre tivemos um pouco de tensão nessas áreas.”
A influência de Syd Barrett, fundador da banda diagnosticado com esquizofrenia, é perceptível, mas o álbum transcende a dimensão psicológica: trata-se de uma reflexão filosófica sobre a existência, sobre os desafios e rotinas que todos enfrentamos.
Uma narrativa sonora e filosófica
O disco não segue uma linha narrativa estritamente linear, mas é possível identificar um fio condutor ao longo de suas dez faixas. O lado A termina e o B começa com uma divisão simbólica, marcada pelo vinil, e os elementos sonoros servem como ganchos para a história que se desenrola.
“Speak to Me” abre o álbum com batidas de coração, sobrepostas a sons e vozes que reaparecem ao longo do disco, sugerindo a fragilidade da sanidade e a presença constante da loucura. “Breathe (In the Air)” introduz a reflexão sobre a rotina e a vida cotidiana, usando metáforas que transformam o banal em profundo. “On the Run”, quase instrumental, captura a pressa e a ansiedade da vida moderna, evocando medos pessoais, como o de voar, de Roger Waters. “Time” marca o despertar do personagem da narrativa: a percepção de que o tempo passou despercebido, uma reflexão universal sobre envelhecimento, escolhas e arrependimentos.
Entre a reverência e a crítica
Roger Waters sempre ressaltou o caráter humano e emocional da obra, afirmando que ela proporcionava uma conexão quase visceral com o ouvinte. No entanto, o consenso não é absoluto. Críticos mais atentos argumentam que, apesar de sua genialidade, The Dark Side of the Moon pode ser superestimado quando comparado a trabalhos posteriores, como Wish You Were Here e Animals. Estes álbuns, mais sombrios e densos, exploram temas sociais e musicais com profundidade ainda maior, oferecendo arranjos intricados e uma visão mais crítica da realidade.
A capa e sua própria narrativa

Se o som foi revolucionário, a imagem que o representou não ficou atrás. A arte criada pelo estúdio Hipgnosis e pelo ilustrador George Hardie transformou um prisma em ícone pop. O feixe de luz que se desdobra em arco-íris tornou-se, talvez, tão reconhecido quanto a própria música.
Mas nem a capa escapou de discussões. Um canal de YouTube especializado em ciência popularizou recentemente a tese de que a imagem contém um “erro científico”: a dispersão da luz não se daria exatamente da forma como está retratada. A crítica gerou uma avalanche de comentários — de um lado, defensores da liberdade artística, para quem o prisma é símbolo e metáfora, não tratado de física; de outro, puristas que valorizam a precisão científica. O que poderia ser apenas detalhe técnico se transformou em mais uma prova de como o disco ainda instiga reflexões e divide opiniões.
Um prisma de infinitas leituras
Cinquenta anos depois, The Dark Side of the Moon segue vivo porque não se limita a uma única leitura. É música, é arte visual, é objeto de culto e também de crítica. É lembrado por sua grandiosidade, mas igualmente questionado por sua suposta “superexposição”.
No fim, esse é o maior triunfo do álbum: permanecer aberto, pulsando e provocando, como se o tempo não fosse capaz de reduzi-lo a uma peça de museu. Ele continua a se reinventar cada vez que alguém coloca a agulha no vinil, ou aperta o play no streaming.
Um lado escuro que, paradoxalmente, nunca deixou de iluminar.