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David Bowie em 10 discos — uma viagem pessoal por suas encarnações sonoras

Não é um consenso. É um espelho. Essa lista é minha, mas pode ser sua também

David Bowie
Imagem: Reprodução

David Bowie foi cometa, foi estrela, foi sombra, foi silêncio. Foi alien, duque, profeta. Um artista que nunca se explicou, porque não precisava. Bowie não se entende — se sente. Se sangra. Ele atravessa a gente como som, como imagem, como estado de espírito. Você não ouve Bowie com o ouvido. Você ouve com o corpo inteiro, em carne viva.



E essa lista que você vai ler agora não é um manual. Não é uma homenagem neutra, nem uma tentativa de encerrar uma conversa. Muito pelo contrário: é o início dela. Porque essa é minha febre pessoal — os dez discos em que Bowie me deixou sem chão. Os dez momentos em que ele me cortou, me elevou, me destruiu e me reconstruiu. É uma lista sobre o que ficou. Sobre o que pulsa até hoje. Sobre o que me feriu bonito.


David Bowie não cabe numa década, nem numa fase, nem num gênero. Ele é movimento. É ruptura. É linguagem do além. É o tipo de artista que desafia a lógica do tempo. E por isso escolher dez discos não é tarefa de curadoria — é uma confissão. Cada escolha aqui foi feita com a alma. Não é sobre técnica, influência ou números de venda. É sobre impacto. Sobre presença. Sobre o arrepio que não passa.


E se você perguntar: “Cadê Heroes?”, eu respondo com calma: “Heroes está em todos eles. E ao mesmo tempo, em nenhum.” Porque aqui o critério não é cronológico, nem acadêmico. É emocional. É aquilo que ainda bate no peito quando tudo em volta já silenciou. É aquilo que volta como um fantasma quando a vida parece sem cor.


Vai dividir opiniões. Vai doer em quem idolatra as escolhas clássicas. Vai gerar discussão. E tudo bem. Porque essa lista não nasceu pra ser consenso. Ela nasceu pra ser ferida aberta. Bowie nunca quis ser entendido. Ele quis ser eterno. E isso, meu amigo, ele conseguiu.


10. ★ Reality (2003)

Reality (2003) - David Bowie
KATHY WILLENS/AP

O último Bowie vivo. O último Bowie mortal. Reality é aquele momento em que ele encara a finitude como quem encara o espelho: rindo. Tem tensão, tem beleza, tem a dor de saber que o tempo não é um conceito — é uma ferida. “Bring Me the Disco King” parece uma elegia adiantada, um sussurro de fim. Não é seu disco mais inovador, mas é o crepúsculo do homem antes da lenda se apagar.


Tem peso emocional. Tem chão. E por isso, entra aqui.



9. ★ Hunky Dory (1971)

Imagem: Reprodução
Imagem: Reprodução

Bowie ainda era só Bowie. Ainda não tinha virado Ziggy, ainda não tinha explodido as estrelas — mas já ensaiava o salto. “Life on Mars?” é o nascimento da dúvida cósmica. “Changes” é o manifesto do eterno reinício. É um álbum de artista em estado de emergência criativa. Um disco de transição que, por ironia, se tornou um dos retratos mais puros do seu caos interno.


Aqui ainda há inocência. Mas a chama já tá acesa.


8. ★ The Next Day (2013)

The Next Day (2013)
Imagem: Reprodução

Quem é que volta depois de uma década calado e lança um disco desses? Só ele. The Next Day é um soco na boca da indústria, um grito fantasma. É Bowie ressuscitado, mas não domesticado. A capa com a cara de “Heroes” apagada é um recado: esquece tudo que você acha que sabe. Ele volta ácido, cínico, violento. “Where Are We Now?” é melancolia pura; “The Stars (Are Out Tonight)” é rock frio, moderno, letal.


Um álbum que cospe no mito pra mostrar que o homem ainda tinha veneno no sangue.



7. ★ Low (1977)

Low (1977) - David Bowie
Imagem: Reprodução

Silêncio. Ruptura. Low não é um disco pra tocar em festa — é pra tocar dentro da cabeça. Com a colaboração de Brian Eno e coprodução de Tony Visconti, é Bowie se desmaterializando em sons sintéticos, em climas, em texturas. O lado A ainda carrega faíscas do rock; o lado B é uma travessia espectral por desertos de vidro. “Warszawa” não é uma música — é uma visão. “Sound and Vision” é o hino de quem perdeu tudo, menos o ritmo. É um disco que não te abraça.


Ele te afoga. Mas muda tua vida.



6. ★ Diamond Dogs (1974)

 Diamond Dogs (1974)
Imagem: Reprodução

Pós-apocalipse glam. Um musical radioativo com cheiro de cidade em ruínas e brilho de purpurina vencida. Bowie mistura Orwell com um cabaré sujo, e o resultado é isso: um disco doente, teatral, marginal. “Sweet Thing / Candidate” é uma das maiores sequências que ele já gravou. “Rebel Rebel” é o hino da androginia orgulhosa. “1984” antecipa Prince, Michael Jackson e tudo que viria nos anos 80.


Um álbum que não pede passagem — invade o palco com sangue nos olhos.



5. ★ Scary Monsters (and Super Creeps) (1980)

Scary Monsters - David Bowie
Imagem: Reprodução

O último suspiro da década Bowie. Antes da fase mais pop, ele entrega esse espasmo de genialidade neurótica. “Ashes to Ashes” revisita Major Tom num mundo quebrado. “Fashion” e “Scary Monsters” cortam como navalha. Mas é em Teenage Wildlife que ele ultrapassa todos os limites — uma canção desconcertante, grandiosa, vulnerável e violenta, onde ele canta com a alma esfolada, rasgando a própria carne lírica até sangrar verdade.


A faixa cresce como uma tempestade que não se contém. É talvez sua música mais bonita. Mais crua. Mais sincera. Aqui ele junta o lirismo do passado com a paranoia do futuro. O som é seco, a guitarra de Fripp é um ataque. É como se cada faixa estivesse sendo devorada por alguma coisa invisível. Uma despedida. Mas em vez de acenar, ele morde.




4. ★ The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1972)

The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1972)
Imagem: Getty

O nascimento da lenda. Bowie deixou de ser homem e virou símbolo. Ziggy não é só um personagem — é o delírio coletivo de uma geração sem direção. “Moonage Daydream” é sexo e espaço sideral. “Starman” é esperança em forma de refrão. E o final com “Rock ’n’ Roll Suicide” é uma queda épica. Pode não ser o melhor disco musicalmente, mas é o mais icônico, o mais necessário, o mais eterno.


É onde tudo muda — e onde muita gente começa.



3. ★ Aladdin Sane (1973)

Aladdin Sane (1973) David B
Foto: Brian Duffy

Ziggy enlouqueceu. E Bowie foi junto. Esse disco é um surto. Um cometa de cocaína, jazz, raiva e erotismo. “Time” é um cabaré distorcido. “Lady Grinning Soul” é um orgasmo com arranjo. O piano de Mike Garson é de outro mundo. “Aladdin Sane” é Ziggy deformado por Londres, Los Angeles e pelo próprio espelho. Um disco que ferve, grita e implode. Glam rock em sua forma mais perigosa.


Bowie estava em guerra com tudo — inclusive com ele mesmo.



2. ★ Blackstar (2016)

David Bowie no clipe de Lazarus

A morte como performance. O fim como arte. Blackstar não é um álbum — é um eclipse. Ele sabia. A gente não. E quando descobriu, era tarde demais. “Lazarus” é a carta de despedida mais linda, mais devastadora, mais Bowie possível. Jazz experimental, trip hop, ruído. Um disco sem chão, sem luz, sem apego. Ele se despediu como viveu: em silêncio, deixando o mundo tentando decifrar o que ele quis dizer.


Ele virou estrela. Literalmente.



1. ★ Station to Station (1976)

Station to Station (1976) David Bowie
Michael Ochs/Getty Images

É aqui que o tempo para. O Duque Branco atravessa a noite com olhos de aço e alma desfeita. É o disco mais poderoso, mais denso, mais perigoso de Bowie. Funk, krautrock, soul, misticismo, cocaína e cabala. “Station to Station” (a faixa) é um épico industrial que te quebra. “Golden Years” é groove em chamas. “Wild is the Wind” é emoção pura, mas sem cair. Bowie está em estado de possessão artística.


Nenhum outro disco resume tanto seu caos, sua sofisticação e seu abismo. É o topo. É o Bowie absoluto.









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