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Anos 90: 10 discos (parte 4) - a era em que a música e a cultura pop mudaram para sempre

Um retrato sensível e profundo dos anos 90, a década em que o rock alternativo, o grunge, o britpop e a música eletrônica transformaram a cultura pop e mudaram o som do mundo para sempre

Sonic Youth  no palco
Sonic Youth - Ebet Roberts/Getty Images

Os anos 90 foram um terreno fértil, talvez o último grande momento em que a música e a cultura pop caminharam lado a lado em pura combustão criativa. Foi uma década em que o underground invadiu o mainstream, o alternativo se tornou identidade e o caos virou estética. O grunge deu voz ao desencanto, o britpop devolveu a euforia, o trip hop trouxe a introspecção das cidades, e o eletrônico abriu as portas para o futuro.



Era uma era em que os gêneros se misturavam, e a rebeldia ganhava novas formas: na atitude, no som, nas palavras. Cada disco lançado parecia carregar o espírito de uma geração que cresceu entre a melancolia analógica e o otimismo digital. Foi uma década viva, imperfeita, e justamente por isso, inesquecível, quando a música deixou de ser apenas trilha sonora e passou a ser linguagem, espelho e refúgio.



  1. Nirvana – In Utero (1993)

Nirvana – In Utero (1993)
Imagem: Reprodução

In Utero é o som do desespero transformado em arte. Depois do sucesso esmagador de Nevermind, o Nirvana volta às origens com um disco cru, desconfortável e absolutamente honesto. Kurt Cobain parece cantar de dentro de uma ferida aberta — sua voz é confissão, ironia e pedido de socorro ao mesmo tempo.


Steve Albini captura tudo com brutalidade cirúrgica: microfones sujos, distorções ácidas, uma bateria que soa como impacto físico. Em faixas como “Heart-Shaped Box” e “All Apologies”, há uma beleza amarga, um lirismo trágico que já pressentia o fim. In Utero é o antídoto contra o próprio mito, uma tentativa de rasgar a pele do sucesso para reencontrar a verdade. Um disco que não busca agradar, apenas existir, e por isso, ainda hoje, soa mais vivo do que nunca.


  1. Sonic Youth – Washing Machine (1995)

Sonic Youth – Washing Machine (1995)
Imagem: Reprodução

Washing Machine é o som da maturidade sem concessões. O Sonic Youth chega aos anos 90 com a mesma fome de experimentação dos tempos do underground nova-iorquino, mas agora com uma clareza quase espiritual. As guitarras continuam em transe, os ruídos ainda são labirintos, mas há algo novo no ar, uma serenidade inquieta, uma beleza que nasce do caos controlado. É um disco em que a banda parece ouvir o próprio silêncio antes de explodir.


Kim Gordon assume o protagonismo em momentos como “Little Trouble Girl”, enquanto Thurston Moore e Lee Ranaldo transformam as dissonâncias em paisagem emocional. Washing Machine não é apenas mais um capítulo da trajetória da banda; é uma meditação sobre o som, o tempo e o espaço. Um disco que gira, gira e nunca se repete, como se o rock tivesse se tornado consciência pura.


  1. Beastie Boys – Ill Communication (1994)

Beastie Boys – Ill Communication (1994)
Imagem: Reprodução

Ill Communication é o caos urbano transformado em celebração. O Beastie Boys chega aqui no auge da criatividade, fundindo hip-hop, punk, funk e jazz com uma liberdade que poucas bandas ousaram alcançar. É um disco que soa como uma rua em movimento, barulhenta, viva, imprevisível, onde cada faixa parece surgir de um improviso genial entre amigos. O trio mistura beats sujos, riffs de guitarra e humor ácido com uma consciência nova sobre o mundo e sobre si mesmos.


Em “Sabotage”, o grupo cria um hino de fúria e adrenalina; em “Sure Shot”, um manifesto de autoconfiança e ritmo. Ill Communication é o retrato da cultura dos anos 90 em sua forma mais autêntica: híbrida, contestadora e irresistivelmente divertida. Um disco que provou que o hip-hop podia ser intelectual e visceral, espiritual e caótico, tudo ao mesmo tempo, como a própria vida nas grandes cidades.


  1. U2 – Achtung Baby (1991)

U2 – Achtung Baby (1991)
Imagem: Reprodução

Achtung Baby é a reinvenção de uma banda, e talvez do próprio rock. Após o colapso emocional do fim dos anos 80, o U2 mergulha na vertigem do pós-Guerra Fria, nas novas tecnologias e nas contradições da modernidade. O resultado é um disco sombrio, sensual e elétrico, em que a espiritualidade irlandesa dá lugar à ironia berlinense. Bono canta com vulnerabilidade e desejo, The Edge transforma a guitarra em arquitetura digital, e Brian Eno molda tudo como um sonho fragmentado.


Em “One”, o grupo encontra o equilíbrio entre o humano e o divino, entre a dor e a reconciliação. Achtung Baby é o som de uma geração se redescobrindo entre ruínas e luzes de neon. Um álbum sobre recomeçar quando tudo parece perdido, e sobre a coragem de se contradizer para continuar vivo.


  1. Lauryn Hill – The Miseducation of Lauryn Hill (1998)

Lauryn Hill – The Miseducation of Lauryn Hill (1998)
Imagem: Reprodução

The Miseducation of Lauryn Hill é uma carta aberta ao coração e à consciência. No auge da cultura hip-hop e R&B, Lauryn Hill cria uma obra que transcende gêneros, misturando rap, soul, reggae e gospel com uma honestidade quase espiritual. É um disco sobre amor, fé, maternidade, identidade e cura, mas, acima de tudo, sobre ser mulher e negra num mundo que tenta definir o que você deve ser.


Cada faixa é uma lição de vulnerabilidade e poder. Em “Doo Wop (That Thing)”, ela celebra a autoestima com ironia e firmeza; em “Ex-Factor”, canta o amor como ferida e aprendizado. The Miseducation of Lauryn Hill é mais que um clássico dos anos 90, é um manifesto sobre integridade e transformação. Um disco que ensinou ao mundo que a verdadeira educação vem de dentro.


  1. Wilco – Summerteeth (1999)

Wilco – Summerteeth (1999)
Imagem: Reprodução

Summerteeth é o som da doçura rachando por dentro. Jeff Tweedy e o Wilco abandonam a crueza americana do alt-country e mergulham em um pop melancólico, cheio de arranjos luminosos que escondem feridas abertas. Cada faixa é uma contradição: melodias ensolaradas embalando letras sobre solidão, desajuste e dor silenciosa. É o tipo de disco que sorri enquanto sangra.


Com ecos de Pet Sounds e Revolver, Summerteeth é um experimento de delicadeza e tormento, uma psicodelia emocional feita de harmonias e colapsos sutis. Em “Via Chicago” e “She’s a Jar”, Tweedy canta como quem tenta salvar o amor do próprio cansaço. O resultado é devastador: um álbum que brilha, mas com uma luz que corta. Um dos retratos mais sinceros da vulnerabilidade moderna, e um dos grandes discos do fim da década.



  1. Mercury Rev – Yerself Is Steam (1991)

Mercury Rev – Yerself Is Steam (1991)
Imagem: Reprodução

Yerself Is Steam é o caos transformado em catarse. No início dos anos 90, quando o rock alternativo ainda se definia, o Mercury Rev apareceu como uma espécie de sonho febril entre o psicodélico e o emocional. O disco soa como um incêndio em câmera lenta: guitarras em combustão, sopros que parecem vir do espaço e uma melancolia que flutua entre o delírio e o consolo. É a beleza no limite da distorção, o ruído buscando redenção.


Em faixas como “Chasing a Bee” e “Coney Island Cyclone”, a banda cria universos de pura vertigem, onde o som se dissolve em emoção. Yerself Is Steam é um mergulho na mente — uma confusão magnífica de barulho, doçura e caos controlado. Um disco que parece se desmanchar a cada audição, mas que, de alguma forma, continua a crescer por dentro de quem o escuta.


  1. The Lemonheads – Come On Feel the Lemonheads (1993)

Imagem: Reprodução
Imagem: Reprodução

Come On Feel the Lemonheads é o retrato perfeito da contradição dos anos 90: melancolia disfarçada de leveza. Evan Dando entrega um disco ensolarado e despretensioso, mas por trás das melodias doces há uma inquietude constante, um coração cansado tentando rir de si mesmo. É power pop com alma de poeta, rock alternativo com cheiro de verão e ressaca.


Faixas como “Into Your Arms” e “It’s About Time” condensam essa dualidade: são canções que soam felizes, mas carregam uma solidão disfarçada de melodia. Dando canta o amor e o desencanto como quem observa o próprio colapso com ternura. Come On Feel the Lemonheads é um disco que não precisa gritar para ser verdadeiro, é a prova de que, às vezes, a dor também pode soar radiante.


  1. The Chemical Brothers – Exit Planet Dust (1995)

The Chemical Brothers – Exit Planet Dust (1995)
Imagem: Reprodução

Exit Planet Dust é o som da cidade em movimento, concreto, ritmo e vertigem. Com seu álbum de estreia, o duo britânico The Chemical Brothers inaugura uma nova era da música eletrônica, transformando o big beat em linguagem universal. O disco pulsa como um corpo vivo, unindo energia de pista e experimentação sonora com uma naturalidade que redefine os limites entre o orgânico e o sintético.


Em faixas como “Leave Home” e “Chemical Beats”, o som é físico, quase palpável, uma descarga de adrenalina e futurismo. Exit Planet Dust é hedonismo com consciência estética, ruído com propósito. Um disco que capturou o espírito dos anos 90: urbano, intenso, imprevisível. É a trilha sonora de uma geração que aprendeu a dançar com o caos, e a encontrar beleza dentro dele.


  1. Van Morrison – The Healing Game (1997)

Van Morrison – The Healing Game (1997)
Imagem: Reprodução

The Healing Game é o reencontro de Van Morrison com a serenidade. Depois de décadas de intensidade espiritual e melancolia, o irlandês entrega um disco que soa como um retorno ao essencial, à fé, à memória, à música como cura. Sua voz, agora mais envelhecida e sábia, carrega um peso doce, como quem aprendeu que o tempo não apaga nada, apenas transforma.


Entre o soul, o jazz e o folk, Morrison constrói um álbum de aura meditativa, cheio de luz e humanidade. Faixas como “Rough God Goes Riding” e “Burning Ground” são confissões cantadas com gratidão e humildade, sem pressa, sem artifício. The Healing Game é o artista olhando para trás e aceitando suas cicatrizes como parte da beleza. Um disco que não busca redenção, apenas paz.




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