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Anos 90: 10 discos (parte 3) — canções que fizeram o mundo soar diferente

A década em que o som virou sentimento, e o ruído, linguagem

Oasis
Imagem: Reprodução

Os anos 90 foram uma explosão silenciosa. Uma década em que o rock alternativo e o indie deixaram de ser marginais para se tornarem o coração pulsante da cultura. Era o fim das ilusões dos 80 e o início de uma nova era, mais humana, mais crua, mais imperfeita. O grunge gritava o desencanto, o britpop reacendia a esperança, e o shoegaze transformava o barulho em transcendência. Cada banda, cada disco, parecia traduzir um pedaço do que significava viver entre o analógico e o sonho do futuro digital.



Nesta terceira parte da nossa série, revisitamos álbuns que moldaram a alma daquela década — entre ruído e silêncio, fúria e ternura, sombra e redenção. Porque os anos 90 não foram apenas sobre música. Foram sobre sentir, e continuar sentindo, mesmo quando tudo já havia passado.



  1. Depeche Mode – Violator (1990)

Depeche Mode – Violator (1990)
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Violator é o momento em que a eletrônica finalmente ganhou carne e alma. O Depeche Mode leva o synthpop à maturidade, mergulhando em temas de culpa, fé, desejo e redenção com uma precisão quase litúrgica. Cada batida pulsa como um coração à beira do pecado; cada melodia carrega o peso de algo sagrado e profano ao mesmo tempo. É um disco que não teme a escuridão, ao contrário, ele a seduz.


Com faixas como “Personal Jesus” e “Enjoy the Silence”, o grupo encontra o equilíbrio perfeito entre sensualidade e melancolia, espiritualidade e vício. Violator é mais do que um álbum icônico dos anos 90, é uma obra que redefiniu o que significava ser humano em meio às máquinas. Um evangelho eletrônico sobre o prazer e a dor de existir.


  1. Oasis – (What’s the Story) Morning Glory? (1995)

Oasis – (What’s the Story) Morning Glory? (1995)
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(What’s the Story) Morning Glory? é o auge do sonho britânico dos anos 90, arrogante, apaixonado, monumental. O Oasis transforma a vida comum em hino, a ressaca em redenção, o cotidiano em mito. Liam canta como quem desafia o mundo, enquanto Noel escreve canções que parecem ter sido esculpidas para durar para sempre. É o disco que definiu o britpop, mas também o ultrapassou, porque ali havia algo que não cabia em rótulos: fé, insolência e uma vontade quase infantil de ser eterno.


Em faixas como “Wonderwall” e “Don’t Look Back in Anger”, o grupo encontrou o tom exato entre melancolia e grandeza. Morning Glory não é só uma coleção de hits, é uma declaração de que o rock ainda podia ser maior do que a própria vida. Um disco que não apenas marcou uma época, mas ensinou toda uma geração a cantar em coro contra o tédio.


  1. Suede – Suede (1993)

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Suede é o ponto de ignição do britpop, mas também algo muito além dele — um retrato sujo, elegante e decadente da juventude britânica às portas dos anos 90. Brett Anderson canta como quem mistura glamour e desespero no mesmo gole, e Bernard Butler constrói guitarras que soam como tempestades noturnas sobre telhados molhados. É um disco sobre desejo, solidão e a beleza trágica de não caber no próprio tempo.


Canções como “Animal Nitrate” e “So Young” são hinos de uma geração perdida entre o amor e o vício, entre a sensualidade e o vazio. Suede é provocante, teatral e visceral, um início explosivo que abriu caminho para toda uma década de bandas que ousaram ser intensas demais, tristes demais e belas demais. Um disco que transformou o excesso em arte.


  1. Air – Moon Safari (1998)

Air – Moon Safari (1998)
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Moon Safari é o som de um sonho em gravidade zero. O duo francês Air constrói aqui um universo de leveza e contemplação, onde cada acorde parece suspenso no ar, entre o analógico e o onírico. É um disco que respira calma em plena era do excesso, que transforma a eletrônica em aconchego e o futuro em paisagem sentimental. Ouvir Moon Safari é como flutuar sobre as memórias, entre sintetizadores suaves, baixos quentes e uma nostalgia que não dói.


Faixas como “Sexy Boy” e “All I Need” são pequenos milagres de sensibilidade e design sonoro, onde o tempo desacelera e o mundo parece mais bonito. Moon Safari é a antítese do caos dos anos 90: um abrigo sonoro, um lugar onde o silêncio também dança. Um clássico que ensinou que o futuro podia soar suave, e ainda assim, profundamente humano.



  1. Blur – Parklife (1994)

Blur – Parklife (1994)
Imagem: Reprodução

Parklife é o retrato mais nítido e caótico da Inglaterra dos anos 90. O Blur transformou o cotidiano britânico, com suas filas, pubs, sarcasmos e pequenos dramas suburbanos, em poesia pop. Damon Albarn observa a vida como quem filma um documentário em cores vibrantes, enquanto a banda mistura punk, soul, pop e ironia com o mesmo frescor de quem não deve nada a ninguém. É o disco que definiu o britpop, mas também o que melhor o subverteu: brilhante, exagerado, teatral e, no fundo, melancólico.


Entre o deboche e a doçura, Parklife traduz um país em ebulição, entre o orgulho e a ressaca, o glamour e o tédio. Faixas como “Girls & Boys” e a própria “Parklife” soam como uma festa em câmera lenta, onde todo mundo sorri enquanto o mundo desaba. É um retrato geracional e um hino à banalidade, o tipo de obra que prova que o ordinário também pode ser extraordinário.


  1. Spiritualized – Ladies and Gentlemen We Are Floating in Space (1997)

Spiritualized – Ladies and Gentlemen We Are Floating in Space (1997)
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Ladies and Gentlemen We Are Floating in Space é um colapso em câmera lenta. Jason Pierce transforma amor, perda e dependência em uma missa psicodélica de proporções cósmicas. O disco soa como se o gospel tivesse se encontrado com o espaço sideral, orquestras, corais e ruídos em dissolução orbitando uma dor que é, ao mesmo tempo, devastadora e divina. É uma obra sobre o vazio que fica quando o amor parte, e sobre a beleza que ainda existe nesse vazio.


Em faixas como “Broken Heart” e “Cool Waves”, há uma sinceridade quase insuportável: cada acorde é uma confissão, cada eco, um pedido de perdão. Ladies and Gentlemen é o ápice emocional dos anos 90, um disco que mistura o sagrado e o profano até que ambos se tornem a mesma coisa. Uma viagem espiritual feita de ruínas, silêncio e redenção.



  1. Pulp – Different Class (1995)

Pulp – Different Class (1995)
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Different Class é o coração pulsante do britpop, mas visto de dentro — do olhar ácido e irônico de quem nunca foi convidado para a festa. Jarvis Cocker transforma o cotidiano britânico em espetáculo, expondo com elegância e sarcasmo o abismo entre classes, desejos e aparências. O Pulp não canta a glória da juventude: ele desnuda suas contradições, seus amores baratos, sua fome por algo que sempre parece estar do outro lado do muro.


Em “Common People”, o hino definitivo da década, Cocker sintetiza toda a tragédia e a comédia dos anos 90: a ilusão de igualdade em uma sociedade ainda profundamente dividida. Different Class é sensual, político e feroz, um disco que dança com ironia sobre os escombros do sonho britânico. Uma obra-prima que fez do sarcasmo uma forma de arte e da lucidez, uma revolução pop.


  1. R.E.M. – Automatic for the People (1992)

R.E.M. – Automatic for the People (1992)
Imagem: Reprodução

Automatic for the People é a melancolia transformada em consolo. O R.E.M. abandona as guitarras aceleradas dos anos 80 para mergulhar em algo mais íntimo, sombrio e humano. Michael Stipe canta como quem compreende a fragilidade da vida — e a celebra mesmo assim. O disco fala sobre envelhecer, perder e continuar — sobre encontrar beleza naquilo que se desfaz. É uma elegia suave, feita de violões, arranjos orquestrais e uma serenidade que só o tempo ensina.


Faixas comoEverybody Hurts e Nightswimmingsão canções que abraçam o ouvinte, sem prometer salvação, apenas presença. Automatic for the People é o oposto do escapismo: é um convite à aceitação, à delicadeza e ao silêncio. Um dos álbuns mais sensíveis dos anos 90, e talvez o que melhor entendeu que crescer também é uma forma de continuar acreditando.


  1. Massive Attack – Blue Lines (1991)

Massive Attack – Blue Lines (1991)
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Blue Lines é o ponto de partida de um novo universo sonoro. O Massive Attack inaugura aqui o trip hop — uma mistura de hip-hop, soul, dub e melancolia eletrônica que transformou a paisagem da música nos anos 90. É um disco urbano e introspectivo, feito de batidas lentas, atmosferas densas e vozes que sussurram verdades cruas. O som parece vir das ruas de Bristol, impregnado de fumaça, solidão e desejo.


Em faixas como Safe from Harme Unfinished Sympathy, a dor e o groove caminham lado a lado, um retrato moderno do desencanto e da busca por calma em meio ao caos. Blue Lines é noturno, sensual e espiritual ao mesmo tempo. Um disco que não grita: hipnotiza. E que ensinou que a revolução sonora dos anos 90 também podia acontecer em meio ao silêncio e à sombra.


  1. Pixies – Bossanova (1990)

Pixies – Bossanova (1990)
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Bossanova é o som de uma banda que aprendeu a fazer do caos uma ciência exata. O Pixies leva aqui seu surrealismo sonoro ao espaço, literalmente —, trocando a agressividade dos primeiros discos por um clima cósmico, melódico e cinematográfico. É o grunge antes do grunge, o alternativo antes de ter nome, uma colisão entre o pop e o absurdo. As guitarras de Joey Santiago soam como explosões solares, enquanto Black Francis canta como quem prega um evangelho intergaláctico sobre amor, alienígenas e desespero.


Em faixas como Velouriae Dig for Fire, o humor e a melancolia caminham lado a lado, provando que o Pixies sempre soube rir do fim do mundo. Bossanova é o elo perdido entre o underground e a revolução sonora dos anos 90, um disco que olha para as estrelas e, ainda assim, fala daquilo que é mais humano: a confusão de existir.

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