Turnstile volta explosivo em Never Enough: um disco que não quer te agradar, quer te sacudir
- Marcello Almeida
- há 22 horas
- 3 min de leitura
Em Never Enough, banda de Baltimore mergulha no excesso como quem mergulha em si mesma

O Turnstile não veio cumprir expectativa. Veio quebrar. Explodir. Se reinventar num disco que não acena pro passado nem se curva ao presente — Never Enough é um gesto de liberdade violento, colorido e sensual. Hardcore que dança. Pop que morde. Psicodelia de porrada na alma.
Brendan Yates, vocalista, frontman e agora também produtor, sabia exatamente onde queria chegar: em lugar nenhum que já tenha sido pisado antes. Depois do impacto de Glow On em 2021, o caminho fácil seria repetir a fórmula, tornar a revolução um produto, transformar catarse em paleta de cor. Mas o Turnstile não nasceu pra conforto. Nasceu pra fricção. Pra colisão entre o grito e o groove, o breakdown e o abraço.
Never Enough abre com a faixa-título — uma ironia escancarada. O que se espera deles nunca é suficiente. Sempre vai ter alguém pedindo o velho Turnstile, o hino pronto, o riff familiar. E a resposta da banda é uma: aqui tá, mas também não tá. Porque logo depois o disco descamba. Se joga no estranho, no híbrido, no impuro. Guitarras distorcidas convivem com flautas de jazz em transe, como em “Sunshower”.
“Dreaming” aparece com metais latinos e um groove que flerta com reggaeton. “Magic Man” é synth-pop de névoa dançante. “Seein’ Stars” é The Police no corpo de uma banda punk. “Look Out For Me” é um épico de sete minutos com sample de The Wire, colagem eletrônica e uma espiral de riffs que parece reinventar a própria cidade de Baltimore em som.
E mesmo com tudo isso, Never Enough é coeso. Não por parecer igual, mas por parecer inteiro. Os vocais de Yates são o elo entre mundos — rasgados, sentimentais, por vezes melódicos, mas sempre urgentes. Ele canta como quem tem uma dor antiga na garganta e uma esperança nova no peito. “É aqui que eu quero estar, mas não consigo sentir porra nenhuma”, ele uiva em “Sunshower”, e essa frase resume bem a sensação de estar vivo em 2025. Você chega onde queria, mas se pergunta o tempo todo se ainda é você que tá ali.
O disco pulsa com esse tipo de contradição. É pesado e leve. Ruidoso e detalhado. Tem o suor do porão (em faixas como “Sole” e “Birds”, que evocam a crueza do início da banda) e a sofisticação de quem gravou no The Mansion, estúdio lendário de Rick Rubin, onde o Turnstile se trancou pra buscar não só o som, mas o clima do álbum. O clima é esse: liberdade com tesão.
E os convidados entram como fantasmas: Dev Hynes, Hayley Williams, Faye Webster, Liam Benzvi. Nomes enormes em participações sutis, diluídos na textura, não no protagonismo. O brilho vem da banda. Os detalhes, das estrelas. A bateria de Daniel Fang merece um parágrafo só pra ela — é melódica, viva, quase vocal. Se você isolar a bateria, ainda reconhece que é Turnstile. Ringo Starr vibes, como disse Grohl sobre os Beatles. Mas mais suado. Mais urgente.
Não é um disco feito pra fã conservador, nem pra trend hunter. É feito pra quem ainda se emociona com música como se fosse a primeira vez. Turnstile não está aqui pra cumprir expectativa — está pra expandir o que é possível dentro do hardcore. E além dele.
Never Enough não é um disco com respostas. É um disco que te joga de volta nas perguntas. E isso, em tempos tão cínicos e formatados, é revolucionário por si só. Eles continuam destemidos, como disse Brian McTernan lá atrás. E mais do que isso: continuam inteiros.

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Eles tão todos no céu azul do Never Enough.