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Por que ainda ouvimos One, do U2?

Às vezes, o amor não é abraço. É fratura

Imagem: Anton Corbijn
Imagem: Anton Corbijn

Como explicar uma música que soa como um pedido de perdão, mas também como uma despedida? One não é simples. Nunca foi. E talvez seja por isso que, mais de três décadas depois, ela continua nos puxando para dentro de uma pergunta: o amor salva? Ou só prolonga o inevitável?



Gravada em 1991, no meio das tensões do U2 no estúdio, ela nasceu de uma banda quase à beira do colapso. Achtung Baby era a tentativa de renascer depois do peso de The Joshua Tree. E, no meio da reinvenção, Bono escreveu uma das letras mais ambíguas da história do rock. Não é uma canção de amor puro. É uma conversa entre duas pessoas que se amam, mas não conseguem mais ser a mesma coisa.


“Is it getting better, or do you feel the same?” Quem nunca fez essa pergunta? Quem nunca olhou para alguém e pensou se ainda valia a pena insistir? O verso seguinte dói ainda mais: “Will it make it easier on you now? You got someone to blame.” A gente quer dividir a dor, mas, no fundo, só aponta culpados.


E aí vem o refrão. “One love, one life…” Parece bonito, parece prometer reconciliação. Mas escuta com atenção. Não é declaração, é cobrança. É um lembrete cruel: temos só uma vida. Só um coração. O que você vai fazer com isso?


“We’re one, but we’re not the same.” Esse verso carrega a ferida central da música. Podemos estar juntos — mas continuamos diferentes. Não há fusão completa, nunca houve. Só convivência frágil, que exige paciência, perdão, escolhas. E como isso dói.



As metáforas religiosas não estão ali por acaso. “Love is a temple, love a higher law”. Amar é um ideal elevado, quase sagrado. Mas também é um lugar onde se entra descalço, com medo de quebrar o que não se pode reconstruir. E a pergunta que ecoa, ácida, não sai da cabeça: “Did I disappoint you? Or leave a bad taste in your mouth?” Quem nunca carregou essa culpa na garganta?


Curioso como uma canção tão íntima se tornou bandeira pública. One virou símbolo de empatia, foi usada em campanhas sobre AIDS, em causas humanitárias, em atos de união. Talvez porque fale do que realmente nos une: não a perfeição, mas as rachaduras. O fato de que a gente erra — e, ainda assim, tenta ficar.



Por que ainda ouvimos One? Porque, mesmo que a gente não queira, essa música diz algo que preferimos calar: amar não é ter todas as respostas. É, às vezes, só continuar perguntando.

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