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Especial safra brasileira/ 1973, parte 1: Poesias, canções e rostos maquiados dos 'Secos & Molhados'

Um especial que explora o Brasil e a música brasileira em 1973. O primeiro texto é sobre o primeiro disco do grupo musical 'Secos & Molhados'. Boa leitura a todos!

Secos & Molhados. Foto: Divulgação


Entra e sai ano sempre fica a análise de anos anteriores na arte e na cultura para servir de inspiração e até mesmo de nostalgia, seja para quem nasceu naquele período e para quem não nasceu usa o recurso da pesquisa para conhecer e usufruir coisas marcantes daquele tempo com sentimentos que passam pela curiosidade de conhecer até a satisfação de apreciar algo que considera maravilhoso.


O ano que será analisado aqui e nas futuras postagens desta série especial é 1973, considerado por muitos como um ano extremamente produtivo, impactante, emocionante e criativo que pode ser analisado em várias camadas culturais e sociais. No entanto, o que será avaliado é o Brasil e a música brasileira, que vivia uma safra já em anos anteriores, como 1972, um período prolífico, eclético e de grande qualidade. O primeiro álbum a ser tratado nesse especial será o inaugural disco do grupo Secos & Molhados. Boa leitura a todos!




Em 1973, o Brasil vivia um regime militar autoritário e repressor que teve como presidente o militar Emílio Garrastazu Médici. Durante seu governo o país viveu verdadeiros extremos tanto sociais como econômicos. Foi com o general que o país viveu o chamado “Milagre Brasileiro” onde a economia através do PIB e da Renda Per Capita, mas, se deu ao fim com a crise do petróleo que afetou não apenas o Brasil, mas, em todo o mundo gerando um caos econômico para os países o que causou uma grande recessão que só foi solucionada mais pra frente.


Enquanto que em termos sociais, era um verdadeiro paradoxo porque houve um uso enorme de tortura e assassinato pelos militares em pessoas, (principalmente aos que eram contra aquele governo), teve linha dura e violenta na educação, saúde pública frágil e o órgão DOI-CODI estava em seu pleno auge. Não à toa que 1973 fez parte de um horrendo e triste período da história do Brasil que ficou conhecido como “Anos de Chumbo”.


As áreas culturais ainda eram fiscalizadas e autorizadas de acordo com a censura, que era chefiada por militares, onde eles podiam vetar ou autorizar o conteúdo analisando se ele fazia críticas ao país e se burlava as regras que os militares colocavam. Isso valia para jornalistas que precisavam de publicar textos, escritores que precisavam lançar livros, atores que precisavam promover peças de teatro e até mesmo novelas e filmes e por fim os músicos que precisavam divulgar suas músicas e discos.



A vida de artista nesse período não era nada fácil, ainda mais, se quisesse ter reconhecimento por sua arte. E João Ricardo sabia muito bem disso. Nascido em Portugal, ele saiu do seu país natal por conta do Salazarismo em 1964. Filho do renomado poeta e jornalista português João Apolinário e através de influências musicais como a MPB e os Beatles e também da literatura formou o grupo Secos & Molhados em 1971 que continha na época os integrantes Fred e Pitoco, entretanto, essa formação dura pouco, pois em julho de 1971, Fred e Pitoco saem do grupo.


Diante dessa situação, a cantora Luli (da dupla Luli e Lucinda), que era uma parceria musical de João, lhe apresenta um cantor que viria ser a cara do grupo, esse músico é Ney Matogrosso, que na época estava vendendo peças de artesanato na cidade do Rio de Janeiro. E poucos meses após a entrada do músico sul mato-grossense no grupo, Gérson Conrad, que na época era vizinho de João, entra para o Secos & Molhados.

Com a formação feita, o conjunto resolve gravar seu primeiro disco que mostra uma impactante capa como se suas cabeças fossem servidas para um almoço ou jantar, uma sonoridade impactante e eclética, um lirismo cheio de poesia e referências literárias que João Ricardo trouxe, integrantes com rostos maquiados e a voz cristalina de Ney Matogrosso.


O autointitulado possui 13 canções e possui arranjos incríveis com presenças de muitos músicos talentosos como Zé Rodrix (integrante do trio Sá, Rodrix e Guarabyra), Marcelo Frias (A quarta cabeça que está na capa do disco), Sérgio Rosadas e John Flavin.


Todas as faixas são espetaculares, com destaque especial para a sua abertura “Sangue Latino” que ecoa como uma súplica que ressalta a importância da América Latina para quem é sul-americano ou ama o continente com um som magnifico. “Amor” chega com uma sonoridade bem elétrica do início ao fim. “O Vira” que brinca com folclore em uma sonoridade inspirada no Vira, um gênero musical de origem portuguesa e que é empolgante e dançante. “O Patrão Nosso De Cada Dia” tem o badalar de sinos como característica marcante com um tom melancólico que traz suspiro reflexivo para dias difíceis.


“Assim Assado” uma faixa bem roqueira e que tem o icônico guarda Belo do inesquecível desenho animado da Hanna Barbera “Manda Chuva” como seu personagem principal em uma letra cheia de fortes elementos. “Mulher Barriguda” que tem em composição uma parceria perfeita entre João Ricardo e o poeta Solano Trindade e um instrumental cheio de nuances e quebras que fazem dela ser bem especial. “Rosa de Hiroshima” uma bela e emocionante interpretação de uma tocante poesia de Vinicius de Moraes. “Fala” encerra bem o disco com trabalhos vocais e instrumentais impecáveis.


'Secos & Molhados' foi o primeiro registro audiovisual de artistas que viriam se tornar um verdadeiro marco na história da música, seja pela parte vocal de Ney Matogrosso que viria se tornar um dos maiores cantores da música brasileira ou nas letras que consagra João Ricardo com versos poéticos que analisam de forma atemporal pensamentos e sentimentos de forma única e eclética em elementos e referências. E por isso esse álbum faz, com muito mérito, da lista de melhores brasileiros de 1973 e da música brasileira em geral com o passar dos anos.

 

Secos & Molhados

Secos & Molhados


Gênero: MPB, Folk, Rock, Rock Progressivo, Glam Rock, Pop Psicodélico

Lançamento: Agosto de 1973

Ouça: "Sangue Latino", "O Patrão Nosso De Cada Dia", "Rosa de Hiroshima"



 

NOTA DO CRÍTICO: 10

 

Veja um vídeo de Secos & Molhados cantando "Sangue Latino":



1973 não teve apenas esse disco de importância. Teve outros. Aguarde os próximos textos!

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