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Contratempos relaciona a ficção com nossa rotina e debate sobre a agitada vida nas grandes cidades

Numa carga dramática bem balanceada, a rotina de Julie chega como algo espontâneo na tela.

Foto: Bonfilm/Divulgação


É muito recompensador um filme que faz refletir, que nos leva a questionar nossa rotina e que nos torna cúmplices da vida que o/a personagem tem ali, embora fictícia, mas nada distante de nossa realidade. É dessa forma que acontece em Contratempos (À Plein Temps, 2021) do diretor Eric Gravel (que também escreveu o roteiro). A produção concorreu a diversas premiações e conseguiu, merecidamente, vencer algumas, sobretudo dentro da França.


No filme, acompanhamos a vida da camareira Julie. Mãe de dois filhos, divorciada, precisa enfrentar uma árdua rotina entre o trabalho e o cuidado com as crianças. As coisas se complicam quando ela se vê diante de uma greve nacional de transportes e precisa encontrar um tempo livre para realizar uma entrevista de emprego melhor.




É neste ponto que o filme tem seu trunfo. Numa carga dramática bem balanceada, a rotina de Julie chega como algo espontâneo na tela. Por conta da brilhante atuação de Laure Calamy, fica a sensação no espectador de que ela seja uma cidadã comum que foi filmada por alguém escondido.


Embora a trama se encaixe mais no âmbito da maternidade, nos desafios de uma mãe em manter-se empregada e cuidar dos filhos na vida conturbada das cidades, o desempenho da protagonista acaba refletido em qualquer pessoa que assiste, não importa o gênero ou estado civil, se é pai ou mãe, tudo acaba gerando uma transferência mútua e necessária de sentimentos.

Apesar da simplicidade da filmagem, a película carrega muitas informações, linguagens e mensagens. Com um resumo do que acontece nas grande agitação do dia-a-dia, podemos arriscar que esse seja um dos filmes mais citadinos destes tempos. A falta de tempo livre, o trânsito caótico, a corrida pelo sustento, o atraso que nossos patrões não entendem e não aceitam, casamento sem sucesso, uma vida melhor que pretendemos deixar aos nossos filhos.



Julie é aquela personagem bem construída, humanizada e moderna que bate corretamente com o personagem de carne e osso da vida real que é o próprio espectador. Entre ser uma mãe carinhosa e uma profissional atenciosa, a dificuldade dela compreende vários desafios: morar em lugar distante do trabalho, lidar com chefe e com colegas de emprego, cuidar dos filhos e ter harmonia com a vizinhança (necessária para cuidar dos seus filhos quando ela não está presente).



Claro que a greve nos transportes ganha o papel de vilã dentro da película. Uma das coisas que mais tememos na vida atual é aquilo que nos tira dos trilhos do tempo, inclusive para quem tem seu cotidiano sincronizado para cada tarefa e obrigação que precisa ser cumprida. Fácil se identificar prontamente com a trajetória da protagonista.


Para acrescentar um território hostil e desgastante à personagem, Gravel preferiu uma Paris, sobretudo noturna, de cores frias e não tão variadas. Por sua vez, no Palácio (hotel luxuoso onde Julie trabalha), cada quarto traz cores diferentes, embora a cor fria continue predominante.

Conforme acompanhamos a vida da camareira, entramos mais em sua intimidade, Compartilhamos tanto de suas risadas e simpatia como de seus desabafos e apertos. Mas a diretora não deseja totalmente trazer o passado da personagem em jogo, e nem precisa recorrer a isso. A linearidade do filme funciona bem e ainda é capaz de entregar uma revelação bem chocante nos instantes finais.


A produção também se relaciona com esse tempo atual onde greves acontecem em vários países (como na própria França) e com muitas questões trabalhistas que precisam ser revisadas. A ficção que não escapa da realidade e que a cada cena nos leva a pensar nos percalços que passamos, nos problemas que enfrentamos. É fácil se identificar com algo assim. Julie é uma personagem dentro de uma crônica que poderia ser contada por nós mesmos.

 

Contratempos

À Plein Temps


Ano: 2021

Gênero: Drama

País: França

Direção: Eric Cravel

Elenco: Anne Suarez, Geneviève Mich, Laure Calamy

Duração: 88 min.

 

NOTA DO CRÍTICO: 7,5

 

Trailer:



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