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Bob Dylan faz 84 anos — e continua indomável como sempre foi

84 anos de um homem que nunca pertenceu ao tempo — e que continua a desafiá-lo a cada verso

Dylan em 1994 durante sua apresentação no MTV Unplugged.
Dylan em 1994 durante sua apresentação no MTV Unplugged. Foto: atlas

Neste sábado, 24 de maio, Bob Dylan completa 84 anos de vida — e segue como um dos artistas mais influentes e revolucionários da história da música. Nada no mundo consegue contê-lo. Nem o tempo, nem a crítica, nem a idolatria. Aos 84, ele segue como sempre foi: um corpo em movimento, mas uma ideia fixa na cabeça — a de nunca se acomodar, a de nunca entregar aquilo que esperam dele.



Dylan nunca quis ser compreendido. Ele preferiu o mistério à explicação, a estrada à chegada, o trovão à calmaria. E por isso mesmo, talvez, nunca tenha deixado de ser jovem.


Dylan atravessou décadas moldando o som e o discurso de gerações inteiras, com letras afiadas, postura contracultural e uma discografia que virou patrimônio cultural da humanidade. De “Blowin’ in the Wind” a “Like a Rolling Stone”, o bardo de Minnesota não apenas escreveu canções — ele cravou hinos em pedra.


Não é exagero dizer que Bob Dylan mudou a história da música pop. Mas isso é só a superfície. Ele fez mais: ele reconfigurou o papel do artista no mundo. Quando todos esperavam um herói da contracultura, ele abandonou o violão e ligou a guitarra. Quando queriam um profeta, ele devolveu enigmas. Quando o chamavam de porta-voz de uma geração, ele desmentia com um sorriso cínico, uma letra hermética e um disco novo que ninguém entendia — pelo menos não na hora. Porque Dylan nunca quis explicar o presente. Ele sempre escreveu para o futuro.



A genialidade de Dylan está na recusa. Na recusa de ser moldado, classificado, canonizado. Ele não cabe em categoria nenhuma: é folk, mas também é blues, country, rock, gospel, jazz, noise, silêncio. É literatura e é rua. É a Bíblia e é Rimbaud. É o velho testamento em forma de vinil arranhado, e o novo testamento que ninguém teve coragem de escrever. Bob Dylan é tudo isso. E ainda assim — ou por isso mesmo — continua sendo só Bob Dylan.


Vencedor do Nobel de Literatura em 2016, Dylan também é conhecido por manter uma vida discreta e, ao mesmo tempo, surpreendente. Nunca se acomodou na sombra da própria lenda. Nunca virou estátua. Segue relançando material raro, excursionando em ritmo constante e soltando álbuns como o visceral Rough and Rowdy Ways (2020), que provou que seu faro criativo ainda está afiado — ainda é faca.


A obra dele é tão vasta quanto indecifrável. E isso é o que a torna eterna. Não dá pra domar Dylan. Não dá pra entendê-lo por completo. A única coisa que podemos fazer é ouvir. Ouvir de verdade. Com atenção. Com entrega. Com os ouvidos sujos de mundo e o coração aberto como uma ferida. Porque Dylan não canta para agradar — ele canta pra cutucar. Pra desestabilizar. Pra nos tirar do lugar. Suas canções não são melodias bonitinhas com refrões de efeito. São visões. São relatos. São mapas do caos.



Hoje, o mundo da música celebra um cara que nunca se rendeu às expectativas, nunca fez concessões e sempre seguiu seu próprio caminho — mesmo que isso significasse desafiar tudo e todos. Ele envelheceu como os grandes deveriam envelhecer: com dignidade, sim, mas também com rebeldia. Com fúria. Com poesia. Com a estranheza de quem ainda tem algo urgente a dizer — mesmo depois de oito décadas de estrada.


Bob Dylan faz 84 anos. E continua tão essencial quanto sempre foi. Mais do que uma lenda viva, ele é uma presença incômoda e necessária. Um fantasma que sussurra verdades que ninguém quer ouvir. Um farol torto, mas aceso, no meio do naufrágio cultural em que vivemos.


E se ainda resta alguma dúvida sobre a importância dele, basta voltar à pergunta que ecoa desde 1965: How does it feel?


A resposta ainda dói. E ainda liberta.

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