Elemento Zero EZ: entre o caos e a luz, uma banda que aprendeu a dançar com o fim
- Marcello Almeida
- há 21 horas
- 3 min de leitura
Tudo que nasce, morre. Mas enquanto pulsa, deixa rastro

Existe uma beleza brutal em observar algo se desfazer e renascer diante dos nossos olhos. Em plena era de plástico e algoritmos, onde quase tudo parece programado pra durar 15 segundos, a Elemento Zero EZ desafia o tempo, o destino e a própria efemeridade da existência com uma discografia que mais parece um diário emocional gravado em fita cassete, gotejando melancolia e resistência.
Nascida no Espírito Santo e nutrida por influências que vão de Joy Division, Jesus and Mary Chain, Placebo e New Order a House of Love, a EZ não faz música para entreter — faz pra sobreviver. Desde 2011, o duo — que hoje conta com Marcelo Schiffler (voz, guitarra, synths) e Jack (baixo, vocais) — vem traçando um caminho sombrio, contemplativo e por vezes agressivo, como se cada faixa fosse uma carta nunca enviada ou um grito abafado no escuro.
E o mundo lá fora ouviu. Rádios independentes da França, Espanha, Reino Unido, Chile, Argentina e Estados Unidos abriram espaço. O selo nova-iorquino Factory Fast Records os colocou em coletâneas. As guitarras sombrias e os sintetizadores climáticos ganharam espaço em estações de Nova York e Portland, provando que a dor, quando sincera, fala qualquer idioma.
Mas a trajetória nunca foi reta — foi cheia de rachaduras, como a vida. Em 2021, o EP “Desconstrução” capturou os efeitos da pandemia com um peso denso, claustrofóbico, quase palpável. A música “Andando No Caos” se tornou um hino subterrâneo, ecoando em rádios do ES e do mundo, como se traduzisse o vazio coletivo com uma precisão cirúrgica.
Em janeiro de 2022, a banda sangra: Fábio de Souza, o baixista original, morre. O baque não paralisa — transforma. Em novembro do mesmo ano, Jack, amigo antigo de Marcelo e Fábio, retorna ao Brasil e assume o baixo, encerrando um ciclo e iniciando outro.
2023 marca o relançamento do primeiro EP “Luz e Sombra” e a entrada em estúdio. No mesmo ano, surge “Dia Nove”, última composição de Fábio, como um sussurro do além.
Mas é em 2024 que a EZ alcança sua obra mais madura e devastadora: o EP “Efêmera” — uma ode à transitoriedade da vida. Com seis faixas (quatro cantadas e duas instrumentais), o trabalho transita entre luto, esperança e superação. A faixa-título, com Jack nos vocais, dilacera e consola ao mesmo tempo. “Rotina”, “Quando um Sol Nascer” e “Dia Nove” continuam essa travessia emocional. Já “Yasmin”, instrumental composta por Marcelo para a filha, é um aceno de ternura em meio à escuridão. O encerramento vem com “Paradisus Efimeri”, uma psicodelia instrumental que parece derreter a realidade — e tudo faz sentido.
A capa do EP, com o fóssil de uma efêmera pré-histórica, não é só estética: é conceito. Concedida pelo Prof. Frederico Salles (UFV), ela simboliza o toque arqueológico das emoções da banda — como se cada nota, cada acorde, escavasse memórias soterradas.
No rastro do lançamento, a Elemento Zero EZ participa do tributo mutante aos Inocentes, reinterpretando a faixa “Rotina”. A parceria com a Mutante Rádio continua em outros tributos (Bombers, Carbona), ampliando o alcance de uma discografia que soa cada vez mais necessária.
Agora, em 2025, a banda prepara seu primeiro álbum completo e um novo show. Não como quem busca holofotes, mas como quem sabe que viver é, acima de tudo, não calar.
Elemento Zero EZ não quer te entreter — quer te atravessar. E se música é um espelho, aqui você vai ver seus próprios fantasmas.
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