“Seventeen”, de Sharon Van Etten: as urgências de falar com quem fomos
- Marcello Almeida

- 26 de set.
- 2 min de leitura
Às vezes, uma canção é mais do que um retrato: é um espelho que atravessa gerações dentro da mesma pessoa

Em 2019, Sharon Van Etten lançou Remind Me Tomorrow, um disco que marcava sua maturidade artística e afetiva. Entre sintetizadores densos e melodias arrebatadoras, surgiu Seventeen — uma das músicas mais poderosas de sua carreira. Ali, Sharon abre uma conversa consigo mesma, não com a artista reconhecida, mãe e mulher adulta que se tornara, mas com aquela garota de 17 anos que um dia acreditou ter o mundo inteiro pela frente.
É uma carta escrita no presente e endereçada ao passado. Uma confissão íntima que se converteu em hino coletivo.
As urgências da juventude
Na letra, Sharon canta sobre as ruas de Nova York que a moldaram, sobre os lugares que já não existem mais, sobre a ilusão de liberdade que os 17 anos carregam. A pressa, a sensação de saber tudo, a urgência de viver rápido demais. Há uma ternura na forma como ela olha para essa adolescente, mas também uma dor inevitável: a de constatar que os sonhos daquela idade colidiram com a dureza da vida adulta.
Não se trata de condenar o passado, mas de acolhê-lo. “Seventeen” revela que a inocência e a ousadia de uma juventude perdida ainda vivem em algum canto da memória — e que precisamos aprender a conversar com elas.
O espelho no videoclipe
No clipe, vemos Sharon emoldurada pela cidade e, em paralelo, a imagem de uma jovem caminhando por aquelas mesmas ruas. Não é preciso saber quem exatamente é aquela garota. Mais importante do que uma identidade literal é a simbologia: ela pode ser a filha que herda o futuro, ou simplesmente o reflexo do eu passado.
É esse jogo de espelhos que amplia o sentido da canção. Sharon adulta encara a si mesma adolescente — e, nesse choque de imagens, todos nós enxergamos o nosso próprio rosto aos 17 anos.
A contemporaneidade do passado
O poder de Seventeen não está apenas em sua força melódica, mas na forma como ela nos devolve uma pergunta incômoda: o que fizemos daquilo que sonhávamos quando éramos jovens? Em tempos de aceleração constante, de nostalgias fabricadas e de uma juventude eternamente mercantilizada, Sharon nos lembra que crescer é um processo doloroso — mas também inevitável.
O diálogo entre seu eu de ontem e de hoje se torna o nosso. Porque todos, em algum momento, ainda conversamos com quem fomos.
“Seventeen” é mais que uma canção. É um lembrete de que o passado não desaparece: ele nos acompanha, nos observa, e exige respostas.















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