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Robert Smith e o luto que se tornou canção no novo disco do The Cure

Quando a música respira, a dor encontra um lugar para existir

Robert Smith, do The Cure
Foto: Charlie Gates

Robert Smith nunca fez da vida uma superfície leve. Sua obra, desde os primeiros passos do The Cure, foi sempre atravessada por sombras, pela beleza da melancolia e pela honestidade brutal de quem não teme expor fragilidades. Agora, décadas depois, essa sensibilidade se condensa em uma das faixas mais pessoais de sua trajetória: “I Can Never Say Goodbye”.



A canção nasceu da dor da perda de seu irmão, uma ausência que o empurrou para um terreno íntimo e devastador. Não é apenas uma música, mas um ritual de luto: um gesto de quem tenta dizer o indizível, de quem precisa transformar silêncio e lágrimas em algo que possa ser ouvido. Smith admitiu que cantar essa faixa é um desafio quase insuportável — não pela técnica, mas pelo peso emocional que ela carrega. Cada palavra parece exigir dele mais do que uma voz; exige entrega, memória, coragem.


Nesse processo, o vocalista buscou equilíbrio: não queria que a letra sufocasse a melodia, nem que a melodia diluísse a dor. Queria uma música que respirasse, que tivesse espaço para a vida e para a ausência, para a voz e para o vazio. E é justamente nesse respiro que “I Can Never Say Goodbye” se torna universal: todos os que já perderam alguém reconhecem o espaço deixado por quem não volta mais.


Smith também refletiu sobre como a passagem do tempo transforma nossa relação com a morte. Na juventude, ela pode ser romantizada, quase um gesto estético; mas quando invade a família, quando rouba os que amamos, ela se revela na sua dureza mais crua. O Robert Smith que escreveu este novo álbum não é o mesmo que entregou “4:13 Dream” em 2008. Há um outro homem ali, moldado por perdas, envelhecimento e consciência da finitude.



Songs Of A Lost World, lançado em 2024, é o primeiro álbum de estúdio do The Cure em mais de uma década. Mas, mais do que um retorno, ele soa como um acerto de contas com o tempo. Smith não apenas canta para seu irmão: canta para todos que ficaram, para todos que carregam o peso da ausência e ainda assim precisam seguir.


No fim, “I Can Never Say Goodbye” não é sobre dizer adeus. É sobre aceitar que algumas presenças nunca partem por completo — elas respiram, como a música, dentro de nós.



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