'O Bar Luva Dourada', um filme sórdido e perturbador
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'O Bar Luva Dourada', um filme sórdido e perturbador

Atualizado: 13 de out. de 2023



O Bar Luva Dourada é um filme alemão baseado no livro biográfico escrito pelo alemão Heinz Strunk, e dirigido por Fatih Akin, cineasta premiado com Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro por “Em Pedaços” (2017). A trama, que se baseia em acontecimentos reais, é ambientada nos anos de 1970, na cidade de Hamburgo. Onde a Alemanha ainda vivia o clima de pós-guerra, e esse ar sombrio, denso e deprimente é captado de forma bem realista pelo filme.


A história conduz pela vida perturbada de Fritz Honka (Jonas Dassler), um ser solitário, desvalido da sociedade, alcoólatra, e com uma fisionomia do tipo ascoso. Honka é corcunda, tem cicatrizes no rosto e problemas na fala. Teve uma infância traumática, foi abandonado pelos pais em um orfanato. Nas poucas vezes que conseguia visitar sua família era espancado pelo pai. Sofreu abusos na infância e 'bullying' por conta de sua aparência.


Honka vive a perambular à noite pelas ruas do bairro St Pauli, local considerado como uma boca do lixo da Alemanha, onde ele gasta no seu lugar favorito os poucos trocados que ganha, uma espelunca conhecida como O Bar Luva Dourada. É nesse ambiente deplorável que o filme apresenta pessoas incomuns, deprimidas, apáticas, solitárias e prostitutas em fim de carreira que se entregam a bebidas. Um cenário sórdido onde Honka, influenciado por sérios problemas psicológicos, abuso excessivo de álcool e uma certa frustração sexual, começa a buscar suas vítimas: prostitutas de meia-idade, alcoólatras, em fim de carreira.


É uma obra barra pesada, que provoca repulsa. O local onde Honka mora é sujo, mórbido e nojento. Ele possui uma série de fotos de mulheres nuas espalhadas pelas paredes da casa, uma coleção bizarra de bonecas, sem falar o mau cheiro que impregna o lugar. É nesse lugar imundo que ele comete seus crimes e esconde os corpos por ali mesmo. As cenas de violência são brutais, incomodam, causam aquela sensação de agonia. Já na abertura há uma cena grotesca e perturbadora.

O longa é ríspido sem ser apelativo, não joga baldes de sangue na tela. Mas as tomadas de câmera e fotografia deixam tudo mais real. Analisando a obra em um contexto geral, ela consegue ser muito mais impactante, por exemplo, que o filme 'A Casa que Jack Construiu' (2018), de Lars Von Trier.

Akin fez um trabalho um tanto minimalista, imprimindo uma ótima radiografia audiovisual de um serial Killer desajustado e perverso, por um roteiro muito bem produzido, repleto de substâncias psicológicas palpáveis e nada convencionais. Em certos momentos a trama deixa transparecer que Honka está constantemente em conflito, lutando contra seus demônios internos, tentando se enquadrar em uma sociedade, lutando contra o alcoolismo e sua constante necessidade de violência. Akin age de maneira precisa e pontual nesses detalhes ao acrescentar dramatizações que aproximam Honka de uma suposta humanização sem isenta-lo de suas atrocidades.


É preciso enaltecer a incrível atuação de Jonas Dassler, que interpreta Fritz Honka com uma proeza incomparável e atuação digna de indicação ao Oscar. Destaque também para a bela Greta Sophie Schmidt, que interpreta a personagem Petra Schulz, que apesar de aparecer pouco no filme, causa um contraste entre realidades. Em meio a imersão de tanta barbárie, repugnância e bizarrice. Ela é a beleza emanada no filme. O figurino e maquiagem aqui são impecáveis. A fotografia realística em retratar os cenários moribundos, é assombrosa.


Tirando algumas liberdades poéticas, o filme expõe de maneira fiel os acontecimentos, não só da vida de Fritz Honka, como também dedica um tempo a outros personagens que frequentam o buraco soturno. A obra em suas entrelinhas traz uma mensagem sobre os esquecidos, excluídos pela sociedade, destruídos pela vida, pessoas que não conseguiram se adaptar ao sistema, e andam por aí imersos em um conformismo, carentes de tudo. Honka é fruto dessa realidade.


O longa-metragem foi exibido no Festival de Cinema Internacional de Berlim em fevereiro de 2019, onde causou discrepância e alvoroço entre os diversos críticos de Cinema, chegando a lotar salas destinadas a entrevistas e coletivas. Em entrevista de 2019, o diretor disse que “apenas fez o filme sem pensar muito”. Akin relatou que ficou surpreendido com a brutalidade do que chamou de “um livro muito forte”, e chegou a se questionar se seria diretor suficiente adaptar o livro para as telas.


Para Akin deve ter sido um duplo desafio produzir o longa, já que o filme é sobre sua cidade, sua vizinhança. O cineasta nasceu e mora em Hamburgo até hoje. Conheceu pessoas que conviveram com o assassino.


Não é um filme indicado para pessoas frágeis. Mas quem aprecia filmes que fogem do convencional e possui estômago forte para cenas grotescas, O Bar Luva Dourada é um aperitivo que vai lhe causar inúmeras reações.


Texto originalmente publicado no portal Urge! Durante o período que colaborei com o site.

 

Ficha Técnica:

Gênero: Crime, Drama, Horror Duração: 1h55min Direção: Fatih Akin Roteiro: Fatih Akin, baseado no livro de Heinz Strunk Elenco: Jonas Dassler, Margarete Tiesel, Katja Studt e outros. Data de Lançamento: 18 de julho de 2019 (Brazil) Censura: 18 anos País: Alemanha/França Mais Informações: IMDB | ROTTEN TOMATOES

Onde ver: Telecine

 

Veja o trailer do filme abaixo:


 

Sobre Marcello

É editor e criador do Teoria Cultural.

Pai da Gabriela, Técnico em Radiologia, flamenguista, amante de filmes de terror. Adora bandas como: Radiohead, Teenage Fanclub e Jesus And Mary Chain. Nas horas vagas, gosta de divagar histórias sobre: música, cinema e literatura. marce.almeidasilvaa@gmail.com

 





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