Entrevista: O Mormaço Severino fala sobre o processo de composição, inspirações e planos futuros
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Entrevista: O Mormaço Severino fala sobre o processo de composição, inspirações e planos futuros

"A composição nasce espontaneamente em qualquer momento, hora do dia. Seja acordado ou dormindo", diz Rauni Vilasboas.

Foto: Maria Reis


A banda O Mormaço Severino, de Cáceres-MT, lançou seu álbum de estreia em dezembro de 2021, em plena pandemia da COVID-19. O disco, intitulado ‘Cânticos das Ruas Estreitas', traz composições autorais, de melodias concisas e elegantes, que enfatizam e externam todo aquele fervor do sentimento regionalista, afável e volúvel, o qual captura belas texturas de alívio e conforto em canções poéticas sobre saudade, amores, solidão, os desassossegos que insistem em bater na porta da alma, a essência e sentimentalismo de caminhar pelas ruas de uma cidade histórica, ensolarada e apreciar o pôr do sol no cais da Praça Barão. Com aparente singelezas, O Mormaço Severino entrega um álbum nostálgico com camadas regionalistas que se aproximam dos gêneros Indie Rock, Blues, Folk e Indie Pop, com boas doses de psicodelia a lá The Doors, em faixas expansivas e experimentalistas.


A banda é formada por Jheine Lima (voz/backing vocals), Rauni Valentim Vilasboas (guitarra/backing vocals e letras), Diego Vicente (teclados), Ronaldo Gonçalves (baixo), Luiz Guilherme (bateria) e Wellington Fernandes (percussão). O disco foi gravado em Cuiabá-MT, sendo selecionado, no MT Nascentes, que integra os editais da lei Aldir Blanc.


O Teoria Cultural teve o privilégio de bater um papo com o carismático Rauni Vilasboas, que nos contou um pouco sobre a trajetória do Mormaço, processo de composição, inspirações e planos para o futuro da banda.


Entrevista realizada por Marcello Almeida e Alexandre Tiago.



 


Primeiramente, gostaríamos de agradecer a oportunidade para esse bate-papo com você. Para começar, fale um pouco sobre o processo de composição e inspiração.


R: A composição nasce espontaneamente em qualquer momento, hora do dia. Seja acordado ou dormindo. Seja de uma frase captada ou do inconsciente. Existem músicas que surgem quando estou praticando violão ou guitarra. Principalmente quando erro um acorde, eu gosto do som que fiz sem querer.


Em 2021, vocês lançaram “Cânticos das Ruas Estreitas”, que na nossa visão, foi um dos melhores discos daquele ano. Sentimos nele, fortes influências de psicodelia de artistas como The Doors e Pink Floyd e de música brasileira como Os Mutantes, Gilberto Gil e Caetano Veloso. Como vocês avaliam esse trabalho agora em 2023?


R: Particularmente, gosto muito do álbum. A produção do nosso querido amigo Henrique Maluf, certamente nos ajudou a chegar em um lugar que engrandece a todos os membros da banda. É gratificante ouvir o álbum e se identificar com a proposta. Claro que não está 100% como gostaríamos, mas o saldo positivo é esmagadoramente maior.


Vocês, são bastante influentes e reconhecidos no estado de Mato Grosso, como você retribui esse carinho dos fãs e admiradores?


R: As redes sociais, são ferramentas que facilitam uma conexão mais próxima com pessoas que apreciam o nosso trabalho. Então faço questão de agradecer a cada marcação, menção, mensagem de apoio ou de apreço. Tentamos ser os mais próximos possíveis. Como em uma rede de afeto.


Muita gente já deve ter perguntado isso para vocês, mas, para 2023, vocês estão planejando algum material novo? Algum álbum, EP ou single?


R: Sim. Estamos preparando dois clipes para esse ano. Ambos serão filmados em Cáceres. E estamos perto de entrar em estúdio mais uma vez para gravar nosso segundo álbum. Esse contará com a produção do Bruno Kayapy, do Macaco Bong.


Foi sem dúvidas um desafio. Gravamos através do edital emergencial Aldir Blanc. E o processo de gravação foi feito em Cuiabá. No período, Cuiabá era um dos principais focos de Covid no Brasil. Então por dia perdemos cerca de 3, 4 horas de gravação



Como se deu a origem da banda? E como chegaram ao nome O Mormaço Severino? Aqui, no site, gostamos muito do nome O Mormaço Severino.


R: Ronaldo e eu escrevíamos poesias e músicas. Precisávamos dar vazão para nossas criações. A primeira vez que falamos em montar uma banda foi em 2004, mas eu ainda mal sabia tocar guitarra. Enfim em 2009 criamos essa banda. Precisávamos de um nome, algo que refletisse o nosso sentimento de angústia e de querer estar em constante movimento. A palavra mormaço, pra quem mora em Cáceres, é um lugar comum. Mormaço traz sofrimento e inquietação. Severino, é uma homenagem ao avô de Ronaldo. Que era peão de comitiva desde os 12 anos.


Em “Bilhetes Rasgados” e “Eu Quero Ver o Pôr do Sol da Sete de Setembro”, ouvimos e percebemos o carinho especial pela cidade de Cáceres, ao exaltar um lado sentimental bem forte nessas canções. Você poderia expor como é essa relação de vocês com o município?


R: Cáceres é sem dúvidas o berço de muitas narrativas presentes nas mais variadas expressões artísticas dos membros da banda. Sejam elas nostálgicas, sofridas, de amores ou noites desgarradas. Além de ser a cidade de um céu lindo, com o por do sol mais bonito que já vi. Viver no Pantanal é poético. Emblemático.



Como você avalia a cena alternativa na cidade de Cáceres-MT? O número de espaços destinados a shows do gênero tem sido satisfatório?


R: Não diria que de fato existe uma cena. O que existe são muitas pessoas talentosas tentando algo que a cidade não oferece. Penso que sempre existiu um espírito de resistência na cidade. Por mais que o local não ofereça espaços para se apresentar dignamente. Ser artista em Cáceres é um ato de rebeldia. Mesmo nós, com um trabalho de 14 anos, não somos valorizados. Porém, o título do álbum é uma menção a Cáceres. A cidade de vielas e ruas estreitas.


Em relação à gravação de ‘Cânticos das Ruas Estreitas’ o que você pode nos dizer sobre o processo de produção, considerando que em 2021 estávamos diante de uma pandemia e de quebra vivendo um (des) governo que tornou tudo ainda muito mais difícil para quem trabalha com arte e cultura, como foi essa experiência para vocês?


R: Foi sem dúvidas um desafio. Gravamos através do edital emergencial Aldir Blanc. E o processo de gravação foi feito em Cuiabá. No período, Cuiabá era um dos principais focos de Covid no Brasil. Então por dia perdemos cerca de 3, 4 horas de gravação. Pois havia o toque de recolher. Foi gravado em um momento de muita tensão. Foram cerca de 13 dias de gravações. Gravamos 10, porém cortamos duas faixas. Por não chegar em um som satisfatório. Faz parte.



Vocês sentem algum tipo de pressão, até mesmo entre vocês, em relação ao segundo disco? Considerando que ‘Cânticos das Ruas Estreitas’ é um grande álbum no cenário da música brasileira independente, o que vocês pensam em relação a isso? Sobre a “síndrome” do segundo disco, acham mesmo que existe essa coisa ou não?


R: Não sentimos. Pois não atingimos um grande público. Então ainda somos uma banda underground nichada. O que sentimos é vontade de gravar o segundo, terceiro. E por aí vai. Temos muitas músicas prontas para gravar. Sinceramente, não sabemos se teremos tempo para tanto material em mãos.


Quando estávamos ouvindo o álbum, lembramos da banda Vanguart, que também foi cria aqui do MT, vocês ponderam sair do Mato Grosso? Acreditam que em uma cidade maior como São Paulo ou Rio de Janeiro as oportunidades são maiores?


R: Acredito que sim. Porém, gostaríamos de lançar o segundo álbum primeiro, e fazer uma turnê pelo centro oeste. Pelos festivais que estão mais perto. Tentar entrar nesse circuito regional e depois, se a oportunidade pintar, sim, tentar fazer algo no sudeste.


Qual o significado da música na vida de vocês? Além dela, quais outras formas de artes são do interesse da banda?


R: Eu tenho a música como meu principal foco no mundo das artes. Mas faço colagens digitais. Que gosto muito. Ronaldo esculpi carrancas em ossos e madeira, Diego é muito bom pintor e escultor, Mc Fernandes, como o nome sugere é Mc. Desenvolve um trabalho no Rap e tem um projeto de levar o Rap para escolas de periferias. O Gui é um grande ator, está sempre circulando com peças do pessoal do Plenilúnio. Grande referência do teatro em Cáceres e no estado. A Jheine é modelo e streamer de jogos. Além de professora.


O que você pode nos dizer sobre o projeto gráfico e o conceito da capa, ficou uma arte bem bacana.


R: Queríamos uma arte vintage e minimalista. Quem desenvolveu a arte foi o multiartista Jhon Douglas. Parceiro de muitos projetos. Ele super se identificou com O Mormaço. Por ser do interior de Rondônia, apesar de hoje estar em Portugal. O conceito do sol foi baseado no filme, Deus e o Diabo na Terra do Sol.


Rápido, curto e grosso, vamos lá? 1filme, 1disco, 1livro, 1série


R: Conta Comigo, Da Lama ao Caos (Nação Zumbi), Vida (keith richards), Samurai Champloo.

Finalizando, gostaria que deixasse aqui uma pequena lista com seus artistas favoritos e um pequeno comentário.


R: Chico Science e Nação Zumbi, Gal Costa, Nirvana, Céu, Ave Sangria, Jimi Hendrix, Calorosa, Arnaldo Antunes, Jards Macalé. Entre milhares.

O Mormaço Severino é o reflexo de uma geração dita como perdida. A geração anos 2000. Nossa arte é a nossa verdade, integrantes que vivem nas periferias de Cáceres e que fazem disso sua força para se expressar. Não somos grandes músicos virtuosos, porém somos os mais indicados para executar essas músicas tortas e doloridas. Como a melancolia do Rio Paraguai.


Encontre a banda nas redes sociais: Instagram, YouTube.

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