Cinquenta anos do magnum opus de Peter Hammill; Um disco de vocais apaixonados, músicas dinâmicas e letras poéticas
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Cinquenta anos do magnum opus de Peter Hammill; Um disco de vocais apaixonados, músicas dinâmicas e letras poéticas

The Silent Corner And The Empty Stage é um disco onde sempre haverá algo novo a ser descoberto a cada audição.

Peter Hammill
Imagem: Reprodução.


The Silent Corner And The Empty Stage, terceiro álbum de Peter Hammill, se comparado ao anterior, Chameleon In The Shadow Of Night, apenas em termos de caráter geral e perspectivas estilísticas, é possível notar bastante semelhanças, mas a partir do momento que nos deixemos levar por uma audição mais profunda, nota-se que se trata de um disco mais requintado e de produção mais sutil, além de entregar uma sonoridade munida de alguns aprimoramentos eletrônicos habilmente aplicados de distorção, oscilação e reverberação. 


Ao mesmo tempo em que a mente brilhante de Hammill parece desbravar um caminho cheio de tempestades, em momento algum ela deixa de se mostrar completamente intacta, ilustrando toda a sua capacidade de ser lúcido mesmo com a quantidade de ritmos e letras que evocam estados de espírito intensamente específicos - e especificamente intensos - durante todo o disco. Talvez a ideia de olhar para o abismo não seja exatamente muito excitante para a maioria das pessoas - principalmente se ele decidir olhar de volta -, porém, Hammill faz isso de forma natural, como se estivesse apenas alcançando uma auto-exploração em busca de uma liberação singular.



Outro ponto que também vale ser destacado, é que exceto aqueles mais devotos e doutrinados pelo rock progressivo, os demais ouvintes, antes de qualquer coisa, podem sentir um pouco de dificuldade com o disco, o achar um tanto “estranho”. Suas letras incomuns e variantes repentinas nas estruturas musicais, às vezes, podem não ser compreendidas de forma instantânea, com isso, afastando quem quer imediatismo. Porém, aqueles que se dispuserem a explorar a música de The Silent Corner And The Empty Stage de forma atenta, serão repetidamente recompensados por meio de novos detalhes que emergem a cada audição.


Os vocais de Hammill são sempre de uma qualidade distinta de um contador de história, inclusive, qualidade essa que o tornou um ícone popular dentro da cena do rock progressivo - embora desagradasse muita gente também. Muitas de suas interpretações ajudaram vários de seus álbuns solos a se tornarem verdadeiros tesouros reverenciados, sendo seu trabalho em The Silent Corner And The Empty Stage o mais valioso de todos, afinal, sua entrega nunca esteve tão poderosa.


Enquanto isso, as contribuições de David Jackson (saxofones e flauta), Hugh Banton (órgão) e Guy Evans (bateria e percussão) é, obviamente, a principal razão dos acenos à Van der Graaf Generator parecer tão presente aqui.


O disco começa por meio de “Modern” em uma pegada acústica e estranha antes da entrada do vocal que soa ao mesmo tempo de forma cristalina e obscura. Por vezes, se torna mais agressiva para combinar com a intensidade das letras, ficando cada vez mais sombria, altamente eclética e poderosa. Hammill como de costume, é impressionante com suas características líricas que combinam brilhantemente com a construção musical.



“Wilhelmina” traz um contraste com a intensidade da peça anterior, tendo seu começo por meio de piano e voz, sendo complementada gradualmente pelo baixo e por um cravo. Tudo é excelente, piano, vocais, as partes acústicas, além de um final comovente e pessoal. “Wilhelmina” é praticamente uma ode a uma garota, um conselho de como a vida poderá ser dura conforme os anos forem passando.


“The Lie (Bernini's Saint Theresa)” da ao ouvinte uma sensação parecida com a da faixa de abertura, embora ela atinja uma obscuridade e intensidade de um modo muito diferente. É construída basicamente em um piano extremamente afiado, vocais incrivelmente poderosos e um sintetizador que a permeia. Em determinado momento, um órgão ao estilo catedral faz uma aparição. As duas últimas frases são muito bem manipuladas, passando do otimismo para a rejeição em instantes. Brilhante e liricamente enigmática onde não faltam possibilidades a aqueles que adoram se desafiar em letras pouco convencionais.


“Forsaken Gardens” é a primeira faixa do disco que foge de uma atmosfera acústica e o coloca dentro de uma sonoridade mais enérgica. A música, que é baseada no livro “O Fim da Infância”, escrito por Arthur C. Clarke e publicado em 1953, começa com Hammill cantando a capela, até que piano e baixo colocam mais densidade no ambiente, enquanto que mais a frente, bateria e flauta são inseridos de forma muito acertada, por último, o saxofone completa uma sonoridade intensa, enquanto que os vocais ficam mais harmonizados.


“Red Shift” direciona o disco para uma linha que é puro experimentalismo. Ótima seção rítmica por meio de uma bateria estranha e linhas de baixo bem pesadas, enquanto isso, a guitarra é muito bem executada, entregando inclusive um excelente solo, algo pouco comum quando falamos das composições de Hammill, já que as guitarras nunca foram um dos instrumentos principais, porém, existe uma explicação pra isso, trata-se do guitarrista convidado, Randy California. “Rubicon” começa por meio de violão e os vocais quando entram soam muito limpos. É encantador a forma como a letra aborda o tema "escolha", além de bastante perspicaz. Baixo e violão são os carros chefe da peça, porém, há algumas suaves invertidas de saxofone vez ou outra.


“A Louse Is Not A Home” encerra o disco e também é o seu grande destaque. Considero uma das músicas mais belas já compostas. O piano inicial é acompanhado por alguns vocais melancólicos quase mórbidos, até que os demais instrumentos entram, com destaque para uma linha perturbadora de saxofone. Possui uma oscilação de ritmo e clima que é brilhante, porém, apesar de uma grande variedade de segmentos, ela sempre se mantém coerente, evitando ser uma peça longa, mas cheia de retalhos. Hammill investiga o medo do desconhecido, descrevendo um misterioso “observador sem rosto” que o deixa inquieto em relação à sua casa atual. Ele questiona os conceitos de lealdade, proteção e pertencimento, perguntando-se se seu lar aparentemente sólido é apenas uma ilusão ou uma máscara para impedir a entrada da escuridão ou do desconhecido. Resumo da ópera, a música sugere que, embora uma casa nem sempre ofereça segurança, ela continuará sendo parte integrante da vida de uma pessoa.



The Silent Corner And The Empty Stage é um disco onde sempre haverá algo novo a ser descoberto a cada audição. São sete faixas, com cada uma delas entregando o seu próprio mundo e sua própria mensagem, mas que de alguma forma, ainda conseguem fazer com que tudo se transforme em um disco fortemente unificado em uma das coleções de músicas mais belas e harmônicas da história do rock progressivo.

 

The Silent Corner And The Empty Stage

Peter Hammill


Ano: 1974

Gênero: Rock Progressivo

Ouça: “A Louse Is Not A Home”, “Modern”, “Red Shift”

Humor: Melancólico, Introspectivo, Sagaz

Para quem curte: Van der Graaf Generator



 

NOTA DO CRÍTICO: 10

 

Ouça "A Louse Is Not A Home"




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