"Quanto mais verdades são descobertas, maior é o abismo"
Aquele dia poderia ser mais um dia normal na vida da escrivã de polícia Verônica Torres (Tainá Muller). Mas, durante uma confusão na delegacia de homicídios que termina com o suicídio de uma mulher, Verônica entra num redemoinho crescente de investigações. Passa a descobrir um universo que envolve intrigas, corrupção, traições e segredos do passado que chegam à tona.
A série da Netflix é baseada no romance homônimo de Ilana Casoy e Raphael Montes que escreveram usando o pseudônimo de Andrea Killlmore. Com um roteiro adaptado por Casoy e Montes, a direção ficou a cargo do experiente José Henrique Fonseca que tem em seu currículo produções de peso como ‘O Homem do Ano’ (2003) e ‘Heleno’ (2011).
Contando até agora com 2 temporadas e 14 episódios, a série traz um elenco estelar e não tem economia em apresentar uma narrativa cheia de ação, drama e mistério, contextualizando o cinema brasileiro dentro de padrões mais modernos e dinâmicos.
A narrativa discute bastante sobre as relações familiares, destacando a violência doméstica. A mulher que sofre abusos ou é violentada/oprimida pelo marido ou companheiro. Caso da primeira temporada onde presenciamos a vida tumultuada do casal Cláudio Brandão (Eduardo Moscovis) e Janete Cruz (Camila Morgado).
Lógico que essa não é a única abordagem a ser tratada. Ainda teremos a questão da deficiência dos meios de proteção que acabam se vendendo. Instituições que deveriam impor as regras em sociedade saem da linha, são corrompidas em subornos e passam a ser uma ameaça maior tanto para as pessoas que deveriam proteger bem como para os profissionais corretos que ainda fazem parte da corporação.
Interessante é notar como cada episódio vai revelando a verdadeira faceta de seus personagens, construindo bem o aspecto emocional de todos. No início, Brandão se apresenta a Janete de forma paterna e carinhosa, mas em seguida o espectador seguirá por uma angustiante transformação que acaba entrando numa espiral opressiva e cada vez mais chocante e trágica.
Sem muito auxílio e limitada por conta de seu cargo, Verônica precisa agir por meios próprios. Desse modo, deve sobreviver num meio hostil que não lhe transmite muito mais confiança e ainda precisa seguir em frente com sua família. É notável como a personagem traz maturidade e determinação em sua veia em cada verdade que é revelada na tela ou em cada porta que se abre sobre os fatos que conclui. A protagonista também precisa lidar com fatos do passado ligados a seus pais que ainda continuam sem respostas.
Nossa protagonista usa da inteligência e criatividade para expor as feridas de um sistema corruptível e ainda lidar com os casos que atende (como o de Janete). Para isso, o seriado procurou mesclar tanto cenas de ação como de investigação. Verônica busca ao máximo pistas com o pouco que tem e tenta nunca deixar seus rastros, agindo ao máximo na surdina. Claro que às vezes ela é obrigada a sair da linha e meios mais extremos são exigidos.
‘Bom Dia, Verônica’ aposta numa boa iluminação noturna. Aproveita bem os cenários que tem a seu dispor: sejam as paisagens urbanas do cotidiano comum, sejam os lugares isolados que escondem um ar macabro e ritualístico.
A série aposta também nos cliffhangers, responsáveis por segurar o espectador que muitas vezes fica confuso sobre o destino de determinado personagem. Quanto mais verdades são descobertas, maior é o abismo que Verônica agora faz parte.
A trilha sonora garante outro charme ao seriado. Assinada por Dado Villa-Lobos e Roberto Schilling, oferece gêneros variados e certamente agradará o espectador fã da boa música. Inclusive, a trilha está em harmonia com as temáticas apontadas, exemplo é a canção “Maria da Vila Matilde” de Elza Soares que cita a violência doméstica. Grandes nomes como Titãs, Belchior, Dalto e Mercenárias completam a atraente e diversificada trilha.
Com um elenco estelar, o diferencial aqui é mostrar grandes atores considerados galãs em papéis incomuns de vilões perturbadores, caso de Eduardo Moscovis e Reynaldo Gianecchini. Tainá Muller no papel de Verônica convence e cresce em cada episódio. Mãe dedicada e profissional incorruptível, é uma personagem marcante que, apesar de ganhar toques de justiceira em muitos episódios, agrada o espectador justamente por ser a contramão num sistema fraco e poluído.
Embora a primeira temporada seja melhor por manter mais o ritmo harmonioso entre ação, investigação e mistério, fica nítido que o fechamento da segunda temporada abre espaços na trama que não está tão perto de terminar. Uma rede de corrupção não acaba facilmente, a vilania está sempre pronta para atacar e a justiça ainda prevalece para quem a trata com determinação.
Bom dia, Verônica
Em andamento (2020-)
Criadores: Ilana Casoy e Raphael Montes
Duração: 2 temporadas
Gênero: Drama, Suspense, violência contra a mulher
Direção: José Henrique Fonseca
Elenco: Tainá Muller, Eduardo Moscovis, Camila Morgado, Reynaldo Gianecchini, Klara Castanho
Onde ver: Netflix
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