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Stranger Things 4 e o espelho do mundo invertido

Atualizado: há 44 minutos

Às vezes, os monstros não vêm do mundo invertido, vêm do espelho

Stranger Things 4
Crédito: Netflix

Este texto nasceu de uma mera curiosidade em revisitar a quarta temporada dessa turminha, agora crescida. Ele altera algumas percepções da resenha publicada em 2022, que você pode ler aqui.


“Stranger Things 4” não é apenas a continuação de uma saga. É o rito de passagem de uma geração. A série, que nasceu entre bicicletas e walkie-talkies, chega agora à idade adulta, e com ela, a consciência de que amadurecer dói mais do que enfrentar demônios interdimensionais.



A atmosfera agora é mais densa, o ar mais pesado. Os irmãos Duffer entendem que a fantasia só é real quando dialoga com a dor, e transformam Hawkins num espelho daquilo que todos nós sentimos, mas raramente dizemos. A amizade, o amor e a perda se tornam o motor de um universo que aprendeu a respirar com a gente. É por isso que Stranger Things nunca foi apenas nostalgia: ela é memória emocional, um afago disfarçado de ficção científica.


A quarta temporada representa esse limiar entre a inocência e o caos. As crianças cresceram, e o mundo, como sempre faz, cobrou sua parte. Os Duffer Brothers traduzem esse amadurecimento em linguagem cinematográfica: um terror que não é gratuito, mas simbólico, carregado de metáforas sobre trauma, isolamento, fé e redenção. O horror de Vecna é o horror interno, o peso das vozes que permanecem quando o silêncio grita.


Entre referências a A Hora do Pesadelo, It, Halloween e tantos outros fantasmas dos anos 80, a série constrói uma colcha de retalhos afetiva. O que poderia ser simples citação vira declaração de amor. Cada plano parece perguntar: “E se a infância nunca tivesse acabado?”.

Mas ela acabou, e é isso que dói.



E então vem Kate Bush...


 Max, personagem de Sadie Sink em Stranger Things
Crédito: Netflix

“Running Up That Hill” explode como um grito espiritual, uma súplica por trocas impossíveis, por refúgio em meio ao colapso. Quando Max corre, ao som dessa canção, não é apenas dela que estamos falando — é de todos nós tentando escapar dos próprios abismos. Essa sequência já nasce eterna: cinema dentro da série, poesia dentro do caos. E quando a música volta às paradas quase 40 anos depois, não é marketing, é destino. É o poder de uma arte que atravessa o tempo pra dizer o óbvio: a emoção nunca envelhece.


A trilha sonora segue como alma do projeto. Metallica, Siouxsie, Talking Heads — todos encaixados com uma precisão que transcende estética: é sobre sentir. Stranger Things 4 nos faz lembrar que a música sempre foi a ponte entre o que somos e o que perdemos. Ela não está apenas no fundo da cena; ela é a cena.


E então surge Eddie Munson — o metaleiro que ninguém levava a sério, o forasteiro que carregava nas costas o estigma de ser “diferente”. Joseph Quinn faz dele mais do que um personagem: faz dele um símbolo. Eddie é o garoto que encontra na música, e no heavy metal, o refúgio contra o caos. Quando o som de Master of Puppets explode no mundo invertido, o que se vê não é apenas uma cena épica: é um manifesto sobre liberdade, sobre resistir sendo quem se é.


Mas é na sua amizade com Dustin que Eddie alcança o impossível: transformar o desajuste em ternura. Juntos, eles constroem uma das relações mais puras e emocionantes de Stranger Things, a prova de que, mesmo em meio ao medo, ainda é possível encontrar beleza na conexão humana. Eddie morre como viveu, tocando alto, acreditando em algo maior. E por isso, paradoxalmente, nunca morre de fato.


Eddie Munson, personagem de Joseph Quinn em Stranger Things
Crédito: Netflix

O elenco inteiro amadurece junto à série. Sadie Sink entrega intensidade e vulnerabilidade, Winona Ryder ressurge com uma luz nostálgica, enquanto Millie Bobby Brown se transforma de experimento em símbolo. O arco de Hopper é sobre resistência, o de Eleven, sobre identidade, e, no fundo, todos eles tentam entender o mesmo que nós: o que acontece quando a infância termina e o medo começa a ter nome?


Há falhas, sim. Mas Stranger Things nunca prometeu perfeição, prometeu emoção, e isso ela cumpre. O verdadeiro encanto está nessa honestidade. O público sente. A série pode até flertar com o clichê, mas o faz com alma, com entrega, com fé.


No fim, “Stranger Things 4” é sobre crescer. Sobre o que se perde no processo. Sobre aprender que o amor também dói, e que os monstros, muitas vezes, usam o nosso rosto.

E é por isso que, quando a última temporada chegar, não será apenas o fim de uma história. Será o fim de uma era.



E talvez, nesse último mergulho no mundo invertido, a gente descubra que o maior susto de todos é perceber o quanto ainda somos feitos de saudade.


A quinta temporada se aproxima como um eclipse, inevitável, silencioso, cheio de promessas e despedidas. Depois de tantos anos, Stranger Things chega ao seu ponto de colapso e consagração. Não será apenas o fim de uma série, mas o encerramento de um tempo: o último grande fenômeno de uma era em que as pessoas ainda paravam para sentir algo juntas. O mundo mudou, nós mudamos, e Hawkins também.


Talvez a despedida doa, mas é justamente isso que torna Stranger Things eterna, porque toda história que nos marca não termina de verdade, apenas encontra outro jeito de continuar dentro da gente.


E quando as luzes piscarem pela última vez, saberemos que o mundo invertido não era um lugar. Era um espelho.

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Trailer da 5ª temporada:

⭐️⭐️⭐️⭐️

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