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PDA, do Interpol: o paradoxo do afeto na era digital

O Interpol antecipou em “PDA” a solidão conectada do nosso tempo

clipe da música PDA, do Interpol
Imagem: Reprodução/YouTube

O Interpol nunca foi apenas mais uma banda do pós-punk revival. Desde Turn On the Bright Lights (2002), sua estreia, Paul Banks e companhia criaram uma linguagem que traduzia em som aquilo que a vida urbana escondia: o frio do concreto, a solidão das multidões, a melancolia como condição inevitável. Dentro desse álbum, “PDA” permanece como uma espécie de síntese — não só musical, mas existencial.



A sigla do título, Public Display of Affection, significa demonstração pública de afeto. Mas aqui o gesto é irônico: não há carinho, há ausência. A canção não celebra intimidade, mas expõe o seu vazio. O entrelace das guitarras e a batida seca soam como a trilha de relações frágeis, cheias de ruídos e silêncios. A faixa soa menos como declaração e mais como diagnóstico.


Esse diagnóstico ganha ainda mais força no presente. Vivemos um tempo em que o afeto se tornou performance: abraços transformados em post, beijos em conteúdo, intimidade em material de consumo. Quanto mais mostramos, menos sentimos. O que deveria ser expressão genuína vira espetáculo. O Interpol, no início dos anos 2000, talvez sem imaginar, antecipava esse cenário de afeto esvaziado.


"And now I can't consider/And now there is this distance, so"

A era digital não apenas mudou a forma de se relacionar, mas também a ideia de verdade. O que é real deixou de ser absoluto para se tornar fragmento: cada um constrói sua versão, sua narrativa. E se a verdade virou múltipla, o amor também se fragmentou. Não é mais partilha, é discurso individual. Relações se moldam no feed, na tela, na lógica de exposição contínua.




É nesse ponto que “PDA” transcende sua época. A ironia do título conversa diretamente com o hoje: vivemos cercados de imagens de afeto, mas carentes de presença real. O vazio que o Interpol cantava não era apenas estético, era profético. O pós-punk revival encontrou na ausência emocional da modernidade digital a sua principal matéria-prima.


E é aí que a música se transforma em reflexão: se o afeto precisa ser mostrado para existir, ele ainda é afeto? Ou já virou apenas espetáculo?


A música não dá a resposta. Mas deixa a pergunta ressoar, como um estalo vivo em meio ao concreto, obrigando-nos a encarar a encenação que habitamos todos os dias.



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