Um texto especial sobre o dia 4 de fevereiro e o show 'Zeca Pagodinho 40 anos'.
Você conhece a frase “Quem não gosta do samba, bom sujeito não é”? Ela é extraída da música “O Samba da Minha Terra”, do baiano Dorival Caymmi, e é seguida à risca por amantes do Samba. Por questões íntimas, sigo-a à risca, pois, em casa, fui ensinado a amar Samba, Forró e MPB da mesma forma que fui influenciado pela MTV Brasil a ampliar meus horizontes culturais e gostar de gêneros musicais internacionais como Rock, Rap, Reggae, Soul Music e Pop.
Zeca Pagodinho, para mim, faz parte desses dois universos desde cedo, seja pelos videoclipes transmitidos, por suas entrevistas cheias de sinceridade e carisma, por ser receptivo com artistas de diversos segmentos culturais, por ser uma pessoa cheia de simpatia e carinho com todos, desde crianças até idosos, ter um legado cultural atemporal que ultrapassa fronteiras e ser um artista que faz um ótimo uso da humildade.
Quando soube que ele faria um show de 40 anos de carreira em 4 de fevereiro, tinha acabado de escrever um texto e estava decidindo se assistiria a “Túmulo dos Vagalumes”, um dos únicos filmes do Studio Ghibli que ainda não tinha visto, se colocaria um CD de Miles Davis para ouvir Jazz ou mesmo se leria um livro. Acabei deixando tudo para outro dia e peguei um CD do Zeca (que não faz parte da minha coleção de CDs e DVDs) para ouvir no Spotify enquanto comia uma coxinha de frango, pensando em como ir ao show.
A princípio, pensei em pedir dinheiro emprestado ao banco para comprar o ingresso e uma passagem para o Rio de Janeiro para ver o show pessoalmente. Mas, ao saber que o Globoplay (o streaming da Rede Globo) transmitiria o evento, desisti dessa ideia porque, com essa plataforma, você consegue assistir a muita coisa ao vivo sem sair de casa. Nesse momento, um videocassete caseiro faz falta para poder gravar e criar um DVD de uso pessoal. Mas, ao mesmo tempo, isso traz uma reflexão sobre o tempo e suas diretrizes temporais.
No almoço, aproveitei para me alimentar cedo, onde pude comer um filé à parmegiana com arroz e batata palha. Na sobremesa, saboreei uma goiabada com creme de leite, sem maiores preocupações.
Quando chegou a noite, resolvi fazer coisas especiais, abri uma cerveja bem gelada e preparei uma tábua de frios com salaminho, queijo muçarela, queijo provolone, presunto e pedaços de pão de forma cobertos por um patê de atum improvisado que eu mesmo fiz, trazendo um clima de boteco, até porque o evento proporcionava isso. Assim que terminei de fazer o petisco, liguei o televisor para não perder nenhum segundo do show. Seja pessoalmente ou em casa, assistindo pela televisão, sempre busco ficar o mais confortável e interativo possível com o evento.
O espetáculo foi marcado por muitos acontecimentos, desde descontraídos até impactantes. No início, os telões projetaram imagens e nomes de artistas importantes para o Samba e para Zeca, como Paulinho da Viola, Martinho da Vila, Arlindo Cruz, Monarco e Beth Carvalho. Logo após essa homenagem, o músico carioca entrou no palco, começando com "Camarão que Dorme a Onda Leva", a música que o projetou como cantor e compositor no cenário musical brasileiro. Posteriormente, brindou o público com um caloroso "feliz aniversário", pois completava 65 anos de idade e 40 anos de carreira. Em seguida, apresentou músicas que mesclam recentes sucessos atemporais do seu repertório, como "Ser Humano" e "Vai Vadiar", respectivamente.
O mestre gaitista Rildo Hora trouxe maestria ao fazer um belo som de gaita, enquanto Zeca fazia uma interpretação magnífica da letra de cunho social “Lama Nas Ruas”, com imagens profundas nos telões que destacam uma reflexão sobre a pobreza.
O Rap e o Hip Hop mostraram o quanto se misturam de forma excelente com o Samba. Nesse contexto, ele trouxe as presenças do ilustre Marcelo D2, vocalista da banda Planet Hemp, que em sua carreira solo apresenta uma mistura magnífica entre esses gêneros, cantou “Minha Fé”. Enquanto isso, Djonga, um nome da nova geração do Rap, fez uma bonita oração para São Jorge em “Ogum”, que, de forma nostálgica, fez lembrar a interpretação que o grupo Racionais MC’s faz para o santo guerreiro em suas apresentações.
Após esse bloco, brincou com a plateia ao expressar seu desconforto com os sapatos, para então fazer uma autêntica roda de samba na presença dos amigos Jorge Aragão, Pretinho da Serrinha, Diogo Nogueira e Xande de Pilares, onde houve conversas e interpretações tranquilas, trazendo leveza para Zeca continuar com suas performances.
Quanto às participações especiais, Seu Jorge, apesar de permanecer menos tempo no palco, fez uma interpretação marcante de “Saudade Louca”. Alcione trouxe brilho ao fazer belos duetos com o carioca em “Mutirão de Amor” e “Sufoco”. Iza cantou com ele “Cadê Meu Amor?” e ainda desfilou no palco enquanto Zeca cantava “Seu Balancê”.
Apesar de tudo, houve momentos curiosos, com Zeca errando letra e até desistindo de cantar “Exaustino” por preferir e gostar mais de cantar “Caviar”, o que rendeu risadas e aplausos do público. Isso mostra o quanto ele é admirado por ser autêntico, talentoso, bem-humorado, amigo dos parceiros musicais, cronista da vida cotidiana, poeta do samba e um gigante em sua generosidade.
As três últimas canções executadas foram as inesquecíveis “Deixa a Vida Me Levar”, “Verdade” e “Bagaço da Laranja”. Nessa última, ele chamou a esposa, os filhos, as filhas e os netos para cantarem juntos e fez um agradecimento cheio de reverência ao público, seja ele presente ou assistindo pelo show pela TV.
Após terminar de assistir, fiquei com a sensação de querer mais, a ponto de verificar quando haverá um show dele na cidade onde moro. Deixei o programa Fantástico para assistir à entrevista com o sensacional Alceu Valença, logo em seguida fui ver os resultados da rodada de futebol e da NBA do fim de semana, descobrir os vencedores do Grammy de 2024 e, por último, pude suspirar com palavras ao vento com recordações de como conheci o trabalho do músico.
Posso dizer que Zeca Pagodinho é Pop por ter feito do domingo um dia especial, por trazer um poço de sensibilidade ao público no palco enquanto entregava interpretações marcantes de seu grandioso repertório, o que faz dele um nome na música brasileira que merece admiração eterna.
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