“Afeto Radical”: Flaira Ferro celebra a força dos sentimentos em um disco plural, potente e necessário
- alexandre.tiago209
- 28 de abr.
- 3 min de leitura
Uma resenha especial feita a quatro mãos de um disco que respira muitos afetos e ricas sonoridades

Em 2025, a cantora e compositora pernambucana Flaira Ferro lança "Afeto Radical", seu novo álbum solo, após os elogiados trabalhos "Cordões Umbilicais", "Virada na Jiraya" e "Áua" — esse último em parceria com Clara Coelho. Com 11 faixas e pouco menos de 38 minutos de duração, o disco marca uma nova fase em sua trajetória: mais experimental, mais livre e, sobretudo, mais afetiva.
Para escrever sobre esse álbum com o carinho que ele merece, este redator convidou a artista visual, ilustradora e escritora Siomara Carlson (@poesia.de.si./@atelie_s.carlson), uma especialista em afetos, para assinar esta resenha a quatro mãos, trazendo uma perspectiva mais afetiva e sensível à obra.
Flaira Ferro integra uma geração brilhante de artistas nordestinos que, desde 2010, vêm redesenhando o cenário da música brasileira com talento, autenticidade e uma forte identidade cultural. Nomes como João Gomes, BaianaSystem, Luedji Luna, Juliette, Sofia Freire, Amaro Freitas e Matuê também se destacam por traduzir a riqueza do Nordeste em linguagens plurais e contemporâneas — levando sons, ritmos e narrativas da região para o mundo. E em “Afeto Radical”, esse movimento é sentido com intensidade, criatividade e emoção.
"Afeto Radical" é uma obra que une ritmos populares nordestinos ao rock, pop e música eletrônica, com produção musical de Guilherme Kastrup. O disco surgiu das reflexões de Flaira Ferro durante o puerpério, após o nascimento de seu filho, e propõe uma escuta sensível sobre como os afetos transformam nossa relação com o mundo.
Logo na faixa de abertura, a explosiva "Afeto Radical", Flaira divide os vocais com Lenine em uma mistura vibrante de frevo, rock e música eletrônica. A canção remete aos legados de Chico Science e Alceu Valença, com energia contagiante que transporta o ouvinte direto para o Marco Zero do Recife ou nas ladeiras de Olinda.
Na belíssima "Os Ânimos", Elba Ramalho empresta sua voz a um dueto impecável, que reverencia Luiz Gonzaga e Dominguinhos, mesclando forró e rock com lirismo e intensidade emocional.
"Sabe" é outra joia do disco. A viola de Laís de Assis ganha destaque em arranjos finíssimos de Dora Morelenbaum, criando uma atmosfera profunda e sensível. Já "Irrelevar", com participação dos vocais de Vanessa Moreno, é uma faixa instigante e bem construída, que amplia ainda mais o leque de sonoridades do álbum.
Um dos momentos mais tocantes está em "A Alma", composta por Isabela Moraes a partir de versos da poetisa Roseana Murray, que sobreviveu a um violento ataque de cães em 2024, em Saquarema, no Rio de Janeiro. A canção é um tributo à força dos sentimentos e à humanidade que eles carregam. É, sem dúvida, uma das interpretações mais emocionantes de Flaira.
As Faixas autorais como “Dança da Estrela” e “Refeição” aprofundam de forma boa o caráter lírico e íntimo do trabalho, explorando o campo emocional com arranjos envolventes e poesia leve.
Encerrando o álbum, "Amigo, Amigo" — outra composição autoral — é uma ode à amizade e ao acolhimento. Uma despedida doce, afetuosa e grata, que abraça o ouvinte com delicadeza.
Com uma capa floral e com traços orientais, "Afeto Radical" também comunica visualmente seu propósito: provocar sentimentos, valorizar a vulnerabilidade e reafirmar a potência dos afetos. Mais do que cantar o Nordeste — o que ela faz com maestria — Flaira Ferro canta o amor, a força do feminino, a coragem de sentir, a importância do acolhimento.
Ela canta sem pedir permissão. Afeto, aqui, é resistência, é corpo que não se cala, é voz que se expande em músicas que abraçam, ferem, curam e provocam.
"Afeto Radical" é mais que um disco — é um manifesto artístico e emocional em tempos que exigem mais sensibilidade e escuta. Uma obra que convida à empatia, ao acolhimento e à liberdade de sentir.

Afeto Radical
Flaira Ferro
Gênero: MPB, Rock, Indie, Alternativo
Para quem gosta de: Alceu Valença, Karina Buhr e Zeca Baleiro
Ouça: "Afeto Radical", "Os Ânimos" e "A Alma"
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